sexta-feira, fevereiro 20, 2009

PARA ONDE OS ESTADOS UNIDOS NÃO RETORNAM

Por Enéas de Souza.

O André Scherer trouxe à baila a discussão sobre a economia mundial. E põe em questão a sua governança.. Estou de acordo com ele. Há uma união muito clara entre os capitais e os Estados Nacionais. A possibilidade desta governança é zero, ou um sonho de idealistas liberais, no puro sentido. O problema, no entanto, é outro, trata-se da reestruturação do sistema econômico e político mundial. Começamos é claro com a derrapagem americana. Ela está envolta em muitos cenários negativos. O mais dramático é a crise econômica, que vamos examiná-la por outro ângulo.. Digo econômica e não financeira. Porque houve duas superacumulações, a das finanças e a da produção. E como a economia capitalista é movida a credito, o consumidor, endividado até o cérebro, acelerou a queda da demanda, bem como, por tabela, o despencar do investimento. Tudo porque a economia dos Estados Unidos tinha uma dinâmica muito clara: aplicações financeiras puxadas por ativos cada vez mais com preços elevados, coisa que dava rendimentos palpáveis e polpudos. Uma parte deles, para a alegria das empresas de bens de consumo duráveis, não duráveis e serviços, eram gastos num festival de mercadorias, ajudados por créditos agressivos apreciáveis.E estas empresas, que vendiam a festa ao mundo americano, dado o sucesso de venda e de demanda, saltavam para novos investimentos, via recursos próprios, bancos, recursos tomados em bolsas, novos investidores, etc.. Resumindo a dinâmica era, nesta ordem, assim: finanças- consumo – investimento.

A verdade é que o tombo das finanças requer uma outra dinâmica. O ponto de vibração, que vai aquecer a economia, será certamente o investimento, mas conduzido pelo Estado, através de um gasto fiscal específico. Só que no momento, todo mundo constata, que este plano do Obama é muito tímido. Mas, já é alguma coisa. Assim, o Estado coloca no picadeiro o investimento autônomo e joga o investimento público na frente na demanda.. Com este passo, ele deve atrair, por efeitos de suas obras, o investimento privado, e, obviamente, recompor o consumo das famílias. Isso será feito num tempo relativamente lento, seja por causa do já alto endividamento público, seja por causa dos endividamentos críticos do setor privado. E, sobretudo, pela dificuldade de recuperação do crédito, onde a nacionalização dos bancos talvez seja a forma mais rápida e mais efetiva de alcançá-la. Até o ex-liberal e o ex-presidente do Banco Central americano, o inefável Alan Greenspan já se converteu, pois apóia esta forma de re-capitalização.

O que estes esquemas macroeconômicos estão mostrando, sob forma bem agregada, é que estamos num ponto de reconversão da economia americana. Vamos sair de uma economia gerida pela especulação das finanças para uma nova economia produtiva, que amparada pelo Estado, vai recuperar a produção e permitir que se organize a recomposição das finanças. Todo esse processo e esta recomposição levarão um bom tempo, eles se farão sob a égide de grandes combates políticos, de grandes disputas econômicas, de grandes chantagens ideológicas e de confrontos de todas as ordens. Por isso, escrevemos que a liderança dessa mudança estrutural, que cabe a Obama, terá que ser feita, sob o manto de um grande presidente. Os acontecimentos terão que fazer dele um Lincoln ou um Roosevelt. Ou uma combinação dos dois. Não basta ser Kennedy. Mas, também não basta ser Clinton. Porque se o jogo no âmbito doméstico vai ser muito duro e cheio de contornos dramáticos, na agenda externa as peças e os filmes vão ser muito complicados. Precisa-se uma recomposição da liderança americana, uma coordenação da economia mundial, uma reconstrução de instituições internacionais para-estatais, uma recuperação do comércio internacional e uma consolidação de uma moeda mundial. O que equivale a dizer que o estadista que se nomeou acima tem que estar nos dois planos, na face de dentro e na face de fora dos Estados Unidos. Mas tudo isso são assuntos para novos artigos. O que nos importa aqui neste texto é salientar que o começo de tudo se passará na economia americana, E que ela tem que fazer uma aposta fundamental: reconverter a sua economia de acumulação financeira numa economia de acumulação produtiva. Transformação que só será possível se o Estado for o protagonista político no comando da reordenação econômica. O que significa ter uma estratégia para a ordem política e econômica mundial.

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