quinta-feira, abril 28, 2011

CRISE FINANCEIRA MUNDIAL
28 de abril de 2011
Coluna das quintas



AS DUAS
GRANDES
ADVERSIDADES
DE DILMA
Por Enéas de Souza



1)As novas questões do Brasil passam pela reordenação de sua política de longo e de curto prazo. Na época de Lula tivemos a passagem, com o olho bem aberto, de objetivos imediatos, marca de FHC dominado pelo neoliberalismo, para um tratamento estratégico dos dois termos temporais citados, definidos por um projeto nacional. O objetivo era sair do labirinto de políticas de duração exígua, concepção do setor financeiro, rumo a uma inserção do Brasil na ordem econômica da globalização. Um futuro mais claro à frente com uma novidade substancial: uma política econômica de melhoria da renda e do emprego. Fazia parte deste projeto a presença do país como um ator de média estatura na política externa, alvo que foi plenamente atingido, tanto que Lula se tornou a grande figura da política mundial em 2010.



2) É preciso ver que as ações na realidade externa são expressões do lado de dentro da sociedade, com uma dose de pimenta dada pelo Estado. O jogo dos grupos sociais tinha se alterado na arena de combates do Brasil durante a primeira década do século XXI. Uma força vital começou a desaguar no governo lulista através do apoio das classes menos favorecidas, por causa da nova formulação da política econômica. E esta força voluptuosa cresceu diante da articulação/desarticulação financeira e produtiva, sobretudo porque esta última área, insatisfeita com a imperiosidade das finanças, aderiu a um projeto mais produtivista, mais de acordo com a facção social que Lula representava. E o grande emblema dessa mutação foi José de Alencar, figura que revelou muito bem essa faceta, pondo uma garantia e um cimento entre a produção e os trabalhadores. Cabe destacar igualmente que as finanças perderam terreno, pois tiveram uma paralisia na sua aliança internacional/nacional por ocasião da crise de 2007. A divergência dos empresários, a associação capital produtivo/trabalho e o crescimento da figura da população transformaram o campo da ação política de Lula.


3) O tempo é algoz implacável dos homens e das sociedades. E vai alterando as suas configurações, uma vez que ele se opõe a si próprio. Como a água, toma a forma de outros recipientes, de outros copos, de outros cálices. Então, o mundo, assumindo a fisionomia do rio de Heráclito, muda de forma permanente. A consequência é que Dilma encontrou, após a eleição, uma dupla adversidade no plano de vôo da nação. A primeira aparece no campo externo: o mundo apresenta uma enredada mundialização em tumulto. Aqui há uma acentuada presença ativa da China, acumulando triunfos políticos e econômicos, com uma estratégia nítida e insistente. Aqui há também um desequilíbrio americano, com ponteiros domésticos em desacerto, buscando fazer uma revisão dolorosa de sua política externa unilateral e militar, tentando barrar os revezes financeiros privados e públicos, e percebendo uma decadência produtiva e mercantil a exigir uma metamorfose tecnológica e empresarial. Ou seja, a geo-economia e geopolítica do planeta aquecem a temperatura dos conflitos. Desenha-se a figura de uma rota de futura bi-polaridade, atravessada, Deus dirá se é verdade, por tintas e cores de múltiplas influências, pois a Índia, a Rússia e o Brasil e tantos outros, tratam de alterar suas posições relativas no conjunto internacional em movimento.


4) Dito de outra forma: Dilma está em face de uma outra etapa de uma nova ordem política e econômica mundial. Tem que ter cautela para agir. E para bem agir, há que pesar os caminhos retos, sinuosos, ou em ziguezague, o mundo não tem mais a cara da unipolaridade americana. Ele está mais complexo e mais à beira do precipício. Os quatro cavaleiros do apocalipse ainda estão cavalgando: crise financeira em desdobramento, mudança do tabuleiro dos conflitos políticos, retorno do movimento social para a ultra-direita e ideologia selvagem dos cortes sociais.


5) Esmiuçando a segunda adversidade, que tem origem nas discórdias internas, vê-se que Dilma está diante de um quadro de luta social mais candente. O fogo do caldeirão já está aceso. Os banqueiros que estavam felizes, com FHC e com Lula, viram, no final do Lula II, as astúcias desse último. A política econômica escorada nos interesses dos bancos e do capital internacional tinha agora um novo sócio; sócio minoritário, de fato, mas novo sócio: as classes trabalhadoras e as deserdadas. Lula tinha feito uma manobra fantástica, com as sobras dos recursos dirigidos às finanças, achou uma janela entreaberta. E culminou por construir uma política coerente para as classes pobres (desde uma política de aumento real do salário mínimo, do programa Bolsa-Família até o começo de uma outra política de habitação). Hoje, estes passos elevaram as tensões sociais de maneira muito forte. Os bancos retornaram, junto com um novo suspiro das finanças internacionais, com o desespero da grande imprensa e de parte dos empresários produtivos ameaçados pela China, a forçarem uma política mais conservadora. Na verdade, o objetivo dos bancos é retornar e desenvolver uma política econômica de figurino financeiro. Em resumo: Dilma está diante desta onda de revival neoliberal, onda do Ocidente e onda brasileira.


6) Por sua vez, as classes trabalhadoras e setores marginalizados, da cidade e do campo, querem avançar. Mas seu desejo está mais para um desejo de melhoria de vida atual, ou seja, desejam novas e mais mercadorias – de moradias às carros – ou seja, um considerável e justo aumento do padrão de vida – e imediatamente. Parece não existir assim espaço, na hora presente,  para uma correção de política na direção de uma maior socialização e para uma nova sociedade que seja mais igualitária, que tenha uma cultura menos banal, que tenha uma passagem para o longo prazo diferente da continuidade desse processo em vigor. Nesse sentido, a luta na sociedade se tornou mais aguçada que no tempo de Lula. Para alterar o rumo, há que traçar uma política que concilie os problemas de agora com a política de futuro. Mas as finanças querem acabar com a política e a estratégia de longo alcance, pois a eles só interessam os ganhos do momento. Esse festival de aporte de capitais internacionais é o que interessa, pois é aí que vai o seu objetivo rentista.


7) Para encarar essa dupla adversidade, Dilma tem que contar com o Estado. E a pergunta é: onde está o Estado? No final do Lula II, como conseqüência inclusive da ação do PAC, o curso estatal se dirigia para uma maior intervenção na economia. Mas o combate das forças sociais tem detido o seu crescimento, já que ele esbarra na resistência dos dominantes e nas múltiplas questões que se agravam no país. Infraestrutura pública (logística e urbana), financiamento do investimento, formação de quadros burocráticos, decomposição do quadro político-partidário, retorno da pressão financeira, etc., etc. Dilma, nesse ponto, está dando passos cautelosos, ao menos na minha consideração. Há uma floresta enevoada na sua frente. Daí a dificuldade de estabelecer, através de uma análise precisa e de uma inteligência esperta, uma estratégia coerente, articulando o longo e curto prazo. E essa observação é nítida, uma vez que a estratégia antiga, a dos tempos de Lula, tem que ser alterada. E Dilma sabe disso e não pode errar, a pressa pode levar a uma terceira adversidade, o atraso do Brasil em relação aos seus parceiros e ao avanço social interno. Há ciladas por toda parte. Na política econômica presente, por exemplo, a gente constata juros elevados, taxa de câmbio em posição contrária à produção, uma desindustrialização inquietante, uma inflação mundial que, por enquanto, está controlada, mas que está aí com a máscara da ameaça.


8) A conclusão: o Estado não conseguiu dar um salto próprio, nem conseguiu realizar uma parceria hegemônica com o setor privado, capaz de atuar no interesse nacional e não no interesse dos grupos particulares. Por isso, não tem forças para poder controlar o câmbio, nem definir positivamente a taxa de juros, nem ter uma política econômica global, etc. O governo de Dilma está agindo cautelosamente para não perder os pontos conquistados. Sente-se, portanto, que o Estado não mudou de patamar. Seja porque as relações das forças sociais nacionais e internacionais não permitem; seja porque o governo ainda está se instalando; seja porque ainda está enfraquecido pela ideologia neoliberal que teve vigência desde os anos 90; seja porque, na luta internacional, o modelo chinês de presença do Estado não encontrou ainda caminho de expansão; seja porque é preciso novamente acumular forças para tentar progredir para uma nova organização estatal, tanto para aumentar as conquistas sociais internas como para encarar o pesado jogo das disputas entre os diferentes Estados. Por qual a razão seja, inclusive levando em conta todas juntas, o Brasil de Dilma está em face das adversidades descritas e da necessidade de rearticular uma política e uma estratégia do dia a dia com o longo prazo. Logo, precisa pesar as forças em contenda e vislumbrar com clareza as oportunidades que surgirão. Por isso, o gesto político fundamental nesta hora indefinida é cautela. Cautela por tática e não por medo. Cautela para dar o passo certo no momento adequado. Está aí exposto o nervo frontal do desafio.


segunda-feira, abril 25, 2011

DEBATES FEE 2011

DEBATES FEE
Rumos do Investimento no Rio Grande do Sul
Palestras/Palestrantes
Conjuntura e perfil de investimentos do BRDE
Celso Afonso Monteiro Pudwell
Economista do BRDE e professor da PUCRS
Trajetória da Competitividade das indústrias de calçados e móveis do Rio Grande do Sul
Achyles Barcelos da Costa
Economista e professor da Unisinos
Dia 27/04 – Quarta-feira
Horário: 14h30min
Local: Auditório da FEE
Rua Duque de Caxias, 1691 - Porto Alegre – RS
O evento é gratuito e aberto ao público

quinta-feira, abril 21, 2011

CRISE FINANCEIRA MUNDIAL
21 de abril de 2011
Coluna das quintas




PARA COMEÇAR
A ENTENDER
NOSSO MUNDO
Por Enéas de Souza






TENSÃO NA ALDEIA MUNDIAL

A primeira coisa visível é certamente a passagem de uma sociedade unipolar, dominada sem pudor pelos americanos da era Bush, para uma sociedade em transição para algo diferente, com um pano de fundo oriental. O comunicado dos BRICS fala em uma sociedade multipolar. Mas acho que a tendência está marcando outra coisa. Temos sim a ascensão da China e, claramente, China e Estados Unidos farão o que Braudel chama a economia mundo tornar-se bi-polar. A China cresce, cresce e vai se expandindo como o sorriso de Ji Hintao. E ela reorganiza países em torno de si, inclusive o nosso Brasil. Tem uma fome de política e de economia, contida há muito tempo. O comunicado dos BRICS fala em sociedade multipolar. Se olharmos um pouco mais, o que estamos vendo é que, na verdade, corre um vento levando a convergência para a dualidade citada acima. Quer dizer que Índia, Brasil e Rússia e África do Sul estão fora? Não, o que eles estão construindo é uma espécie de multipolaridade junto à biopolaridade, que vai funcionar como um pêndulo, ora caindo para o lado americano, ora para o caminho chinês. Basta ver o Brasil. Comércio com este, diplomacia com aquele. E assim, cada integrante da BRICOLÂNDIA tem a sua própria oscilação, o seu próprio movimento, a sua figura pendular.

Leitor amigo, precisamos nos entender bem. Temos dois motivos da tensão e da instabilidade no atual sistema mundial. Primeiro, é a passagem do sistema unipolar para o sistema bipolar. Esse trânsito tem a suas próprias perturbações, os seus próprios entraves, os seus próprios floreios. Por exemplo: a tensão entre um Estado dominado pelo capitalismo financeiro, que é o americano; e um outro, com um caráter de capitalismo estatal, obviamente chinês. O efeito visível maior dessa tensão aparece candente no câmbio. O segundo motivo é que o crescimento da economia mundial, financeiramente dominado pelos Estados Unidos e produtivamente pela China, criou um sistema econômico mundial crítico. A crise de 2007 encaminha o mundo agora para a necessidade de um rearranjo político e econômico. É preciso pintar uma nova casa. E nesse ponto, dado a ausência ainda de uma nova ordem internacional, países como Brasil, Índia e Rússia estão afetados por diversos fatores, por uma instabilidade sem perspectiva de resolução imediata. Só resta agirem pendularmente, em torno da bipolaridade, aumentando a tensão do sistema mundial. Já os europeus se inclinam em decadência, com uma preponderância alemã, para o lado americano e a África para o lado chinês.

A MODELAGEM DA TENSÃO

A competição entre os Estados Nacionais se acantonou entre duas formas de Estado. Como a realidade mundial antes era organizada pelos Estados Unidos, esse foi capaz de modelar politicamente o mundo pós-guerra fria. Primeiro, uma hegemonia da democracia liberal; segundo, a manutenção do dólar como moeda, mas com a instituição de um dólar financeiro, baseado na taxa de juros e na venda dos títulos do Tesouro Americano. Por qual razão? Simplesmente, porque os anos 70 do século passado foram os anos da mutação fundamental do capital financeiro. O capital financeiro é uma forma de expansão do capital, aparecida no final do século XIX, que se dá via órbita produtiva e via órbita financeira. Só que nos anos que estamos falando, ele fez uma metamorfose exemplar. Antes, o que tínhamos era a hegemonia do produtivo. E a partir daqueles anos, o capital passou, astuciosamente, a ter uma preponderância do outro ramo. Portanto, uma metamorfose impar do capitalismo, com o triunfo total das finanças.

(Em parêntese: quem quiser conhecer num texto sintético, mas rigoroso, sobre a época, pode recorrer a um trabalho de André Scherer e meu. Ele leva o título de “Período 1979-2009: Ascensão e Queda do Capital Financeiro”, publicado pela FEE no conjunto de trabalhos sobre as “Três décadas de Economia Gaúcha”. Está no marco do primeiro livro “O ambiente regional”).

DE ONDE VIRÃO O NOVO ESTADO E A NOVA MOEDA?

1) A queda das finanças em 2007, numa rocambolesca crise que deu uma pausa enganadora em 2009/2010 ao mudar de nível, combinando agora crises políticas e econômicas, não trouxe até o momento uma mutação substancial no plano do Estado, da hegemonia financeira. A produção não retornou nem retomou o comando da economia e da sociedade. O Estado americano se enrolou todo nas trapalhadas financeiras. E as finanças, com o poder do dinheiro, por intermédio dos lobbies, conseguiram parar as possíveis transformações do Estado americano, atando as mãos e os atos e as idéias de Obama. E fez mais: enfiou a culpa de suas trapalhadas nele, Estado, e nele, no novo presidente, depois de ter alcançado, com açúcar e com pacotes econômicos, a sua salvação. E a crise política americana em andamento é resultado da crise conjugada financeira e produtiva.

2) Tudo é muito claro: terminou uma época do capital; só que terminou, mas não acabou, nem a hegemonia foi ultrapassada. As finanças continuam a respirar. E ajudadas pelo Estado americano, a quem continuam mandando, engenharam um esquema. O resultado é a ação do FED dando dinheiro para os bancos – uma expansão de liquidez – que permite ao setor, como diria ex-governador gaúcho Olívio Dutra, se espraiar pelo mundo. E especular com as commodities (petróleo e alimentos!). E penetrar em sistemas financeiros internacionais, como o Brasil, trazendo o aumento do valor da moeda local (o que facilita as exportações de Tio Sam), causando problemas para as dívidas nacionais e para os déficits dos governos. E com um poder sinistro: aportarem parte da inflação que a liquidez do sistema causa. Ora, tudo isso vem do dólar. Um dólar sustentado por um Estado que permite o respiro das finanças, que, ao respirar, incomoda. Não a si, mas aos outros.

3) De outro lado, como desdobramento do sistema mundial, cresceu nele, como uma planta um pouco exótica, o dragão chinês. E os americanos sempre acharam que a China era útil para receber as empresas americanas em busca de baixo custo, e que a política chinesa de saldos comerciais, poderia financiar o déficit do Tesouro. Uma esperteza dos “ours boys”. Mas o que a gente quer, não determina a vida dos outros. Resultado: a China construiu um Estado burocrático, descendente da revolução comunista de Mao, um Estado no mínimo autoritário, que usou todas as suas forças para resolver a crise asiática, que também bateu nela, nos anos 1990. E resolveu via exportação e atração de capitais que se deslocavam para lá e, com isso, deu um dos maiores saltos desenvolvimentistas da história. Trouxe, na curva do processo, uma posição muito simples quanto a moeda. Ela tinha que ser dirigida, manejada e controlada pelo Estado. Era assim, foi assim, e assim continua.

4) Quando começa a estourar a crise financeira mundial as coisas saem do plano do desenho ligeiro e pouco nítido e a crise traz dois graves problemas para os Estados Unidos: uma decadência da produção e um atravancamento do sistema financeiro. E daí, meus caros amigos, os banqueiros e os políticos americanos queriam e pensavam que iam ter pela frente uma dócil China. Os chineses, de fato, sorriam sim, mas não faziam, nem fazem o que os americanos sonhavam e sonham. De repente, a realidade aparece, aquela planta exótica torna-se a segunda potência econômica do mundo. E que joga estrategicamente bem: negaceia as insistências americanas, continua a manejar o yuan e acaba por questionar o dólar como moeda mundial, moeda de conta, moeda de comércio e moeda de reserva. Esse questionar surge agora de forma mais ampla, pois o mundo se deu conta das manobras americanas. E veio nessa nova trajetória algo mais forte, uma proposta da última reunião dos BRICS em Sanya. A BRICOLÂNDIA, na sua diversidade e nas suas divergências, tem, entre convergências, essa de discutir o papel do dólar como moeda. Ou seja, trata-se de propor uma nova. E, claro há uma pretensão no ar. Se por acaso não for possível colocar outra moeda no lugar, se os Estados Unidos resistirem como tem resistido, existe em oculto ao menos uma idéia em exame. Quem sabe, um projeto: cindirem o sistema financeiro mundial em dois. Um regido pelo dólar e outro por uma moeda, do estilo do DES (Direito Especial de Saque) do FMI.

5)Esta cisão seria uma estratégia para conter as manobras escandalosas dos americanos de expandirem sua liquidez para o resto do mundo, visando reconstruir as finanças e a sua economia à custa dos outros. Sempre vem aquela idéia da locomotiva americana. Ou dito de outra forma: o que é bom para os “States”, é bom para o mundo. Mas o mundo mudou e o sistema internacional – com essa tensão Estados Unidos e China emergindo tanto na questão do Estado como na questão monetária – seguramente já marca um passo no processo de transformação da ordem política mundial A viagem parte da estação unipolar para a bipolar, com escalas na multipolaridade do Brasil, Índia e Rússia. Da janela do avião se enxerga o colorido desses múltiplos atores. Que ninguém se engane: ao mesmo tempo, essa ordem política mundial precisa reorganizar toda a sua estrutura paraestatal, de ordem supranacional. ONU, FMI, Banco Mundial, OMC, etc... Há igualmente que reformular a relação dos países e regiões (vão ter que ser definidas a posição da Europa – enfim, da Inglaterra, da Alemanha, da França – do Oriente Médio, da América Latina, da África, para que esse novo modelo emerja com força e com dominância. E nesse panorama, a moeda – manutenção ou não do dólar – dará o sinal, no devido tempo, de que o sistema passou para uma nova ordem.


Quantos debates, quantas chantagens, quantas concepções, quantas estratégias, quantas reuniões, quantos acordos, quantos combates militares, quantas ações e conflitos políticos, quantas competições de mercados, quantas soluções produtivas e financeiras, quantas inovações tecnológicas, quantos arranjos entre as nações serão necessárias para chegarmos a uma nova organização das ordens política e econômica mundial?

quarta-feira, abril 20, 2011

Cheap Asia imports hit Brazil’s industry

From lipsticks and handbags to plastic figures of Buzz Lightyear, almost everything Priscila is selling in her small shop in São Paulo’s Paraisópolis favela, or slum, has been made in China.

“It’s just so much cheaper,” the shop owner says, pointing out items that would cost over five times as much if they had been manufactured in Brazil. “It has to be; otherwise lots of people here couldn’t afford it.”

Further down the hill from Priscila’s shop in Paraisópolis’s only chain store – Casas Bahia, a household goods retailer – it is the same story. Here most of the cheaper appliances, such as the electric drills, are “Made in China”.

As inflation rises in Brazil – it hit 6.44 per cent as of mid-April, only a fraction short of the upper end of the central bank’s upper limit of 6.5 per cent – the government of President Dilma Rousseff is facing a dilemma.

Cheap imports from Asia help to reduce the price of household goods but they are also accused of undermining domestic manufacturers. The government is being forced to choose between local industry and protecting the poor from inflation.

“Imports have a deflationary impact; they act as a brake on rising prices,” said Hugo Bethlem, vice-president of Pão de Açúcar, Brazil’s biggest retailer.

Fuelled by rapid credit growth in the lead-up to last year’s presidential election, Brazil’s economy expanded 7.5 per cent in 2010.

The government is forecasting that it will grow about 4.5 per cent this year, but the slowdown has not been enough to reduce the overheating in the economy.

Economists expect inflation to breach the central bank’s target level this month and to peak in August at about 7 per cent. Meanwhile, the central bank has responded by raising interest rates – it was expected to increase the benchmark Selic rate of 11.75 per cent late on Wednesday by another 25-50 basis points.

But Brazil’s interest rates are already the highest of any large economy. Further increases are only attracting more hot money inflows from abroad, worsening what Brazil calls the “currency war”, the steady appreciation of its currency, the real, against the US dollar.

In recent weeks, the real has appreciated from a level of about R$1.65 against the dollar to between R$1.55 and R$1.60.

To augment the interest rates increases, the government is implementing capital controls that seek to dampen consumer credit growth – one of the sources of overheating in the economy.

It is also introducing taxes that aim to discourage companies from borrowing dollars abroad at low interest rates and then repatriating the proceeds to Brazil, a trend that is strengthening the real.

In the meantime, it is trying to protect domestic manufacturers from the stronger real, which is leading to a flood of cheap imports, by raising tariffs, particularly on Chinese goods.

Only a few days before Ms Rousseff left on a five-day trip to China this month, Brazil slapped an anti-dumping tariff of $4.1 per kilogramme on Chinese-made synthetic fibres, in response to growing pressure from domestic industry lobby groups. Economists say, however, that these trade protection measures run counter to the government’s main battle, which is against inflation. “They are not making the calculus that ‘we are going to use cheap imports to fight inflation’,” said Christopher Garman of Eurasia Group.

“Essentially, the government has multiple strategies – they don’t want to compromise growth, they don’t want currency appreciation and they don’t want high inflation but it’s hard to have your cake and eat it too,” Mr Garman added.

Ultimately, the government may be fighting a losing battle against cheap imports. While China accounted for about 14 per cent of total imports to Brazil last month by value, according to the industry and trade ministry, Chinese goods already dominate certain Brazilian industries, such as textiles made of synthetic yarn.

Meanwhile, Brazilian importers of textiles from China insist that they will keep buying in spite of higher tariffs. “Brazilian industry just doesn’t produce enough to meet demand,” said Jonatan Schmidt, president of the country’s Association of Textile Importers.

“We will just keep on importing and it will be the consumers who end up footing the bill,” he said.

quinta-feira, abril 14, 2011

DEBATE NA FEE




DEBATES FEE

Conjuntura em debate: contexto internacional e política econômica

Palestras/Palestrantes


Desindustrialização: realidade ou risco?
Fernando Maccari Lara
Economista – Núcleo de Estudos de Política Econômica/FEE

Brasil na América Latina: protagonismo e pragmatismo.
Luiz Augusto Estrella Faria
Economista e professor da UFRGS – Núcleo de Estudos de Política Econômica/FEE

Os incertos rumos da política internacional.
Paulo Fagundes Vizentini
Professor e Coordenador do Curso de Pós-Graduação em Estudos Estratégicos Internacionais da UFRGS

Dia 18/04 – Segunda-feira
Horário: 9h30min
Local: Auditório da FEE
Rua Duque de Caxias, 1691 - Porto Alegre – RS
O evento é gratuito e aberto ao público


CRISE FINANCEIRA MUNDIAL
15 de abril de 2011
Coluna das quintas



DO TEATRO DA
POLÍTICA MUNDIAL
À CRISE PORTUGUESA
Por Enéas de Souza




Retorno das férias, tendo passado um tempo na Europa. E vou fazer algumas observações sobre diversos aspectos da geopolítica e da geoeconomia mundial, que de lá pude observar.



O JOGO DOS CACHORROS GRANDES

O grande jogo estratégico dos Estados Unidos é tentar uma rivalidade USA-China, agora, na brasa, onde certamente levariam vantagens, se tudo continuasse no ritmo presente. Mas o jogo é muito mais complicado. Primeiro, a China não está indo nessa. Está jogando bem com uma idéia de multiplicidade de pólos, os BRICS, embora com alta divergência, podem ser ligeiramente hegemonizados por ela, exatamente pelo seu atual poder econômico. Sim, a China tem dinheiro, tem indústria, tem uma perspectiva tecnológica, tem um Estado que joga pesado, tem uma diplomacia ativa. E, sobretudo, tem sabido evitar os confrontos que eventualmente os Estados Unidos propõem, porque ela tem uma estratégia de longo prazo. Não acredito, pelo nível da velocidade de vôo do mundo, que o poder americano seja batido a curto prazo. O que é certo é que os Estados Unidos não podem manter uma hegemonia financeira privada, com um Estado com uma dívida enorme, um déficit não totalmente controlável e uma política externa com derrotas acachapantes como a do Iraque e tão sem proposta de longo prazo. O que não quer dizer que não poderão encontrá-la. O problema é que as finanças continuam mandando e desatando os objetivos mais coletivos, via lobby, detonando, com essa astúcia vulgar, as intenções positivas do governo de Obama. E, além disso, todo mundo sabe, é de uma palpabilidade irritante, as finanças não têm projeto de longo alcance. Só lhe interessa o caráter rentista da economia, que são evidentemente os resultados imediatos do jogo financeiro. Desse jeito, a China está dando um salto estratégico fundamental; segundo no ranking das nações ela já é. Portanto, fiquemos atentos à atual visita da Dilma (e o renovado apoio da nação chinesa à pretensão do Brasil ao assento permanente no Conselho de Segurança) e à reunião dos BRICS, que está acontecendo hoje naquele país. Os ventos da Ásia estão soprando em direção ao Ocidente. E virão juntas, mentalidades novas em todas as áreas, da economia ao campo financeiro, da educação às alterações na cultura. E uma reorganização outra na ordem econômica e política mundial.



Será que estamos preparados para tal acontecimento?



JAPÃO EXPLODE A ENERGIA NUCLEAR



A crise japonesa, com a eclosão do sistema nuclear energético, parece sepultar, pelo menos de imediato, por temor, por segurança, por tecnologia, a perspectiva dessa energia substituir o petróleo. As questões de segurança espalham crises de medo até mesmo onde elas são dominantes e relativamente bem cuidadas, como na França, por exemplo. As turbulências no Oriente Médio ajudam – e muito – a agudizar o quadro energético, porém não deixam de reforçar incandescentemente o próprio petróleo como elemento essencial do atual quadro do setor. Claro, as alternativas da bioenergia, da energia eólica e da energia solar retornam com força. Mas tudo envolve investimento, custos, concorrências, apoios estatais, estratégias nacionais, conflitos militares, ideologias, etc. Logo, muita energia retórica e científica no campo das energias.



A FRANÇA VAI DANÇAR À ESQUERDA?



A Europa está sofrendo um processo grave de deslocamento do plano econômico internacional, com vários países em derrocada, como Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha, Itália e a própria França. O que se percebe é um triunfo da Alemanha, com Ângela Merkel firme no comando do processo, apesar de uma derrota interna recentemente. O triunfo alemão é tanto econômico quanto político. Ela está deixando a França, em franca deterioração sarkosyana, para trás e a Inglaterra com o seu contínuo discurso do rei – e do conservador Cameron – fazendo, como quase todos os atuais governantes, figuração e astúcias midiáticas. Na França, as duas eleições cantonais recentes, mostraram três fatos marcantes: a queda do sarkosysmo, a ascensão da filha de Le Pen e um triunfo quase animador dos socialistas. Em enquetes nos dias seguintes, o grande nome para “a presidencial” de 2012 será Dominique Strauss-Kahn, atual presidente do FMI. Disparado. Tem cara de francês, tem habilidade política, saiu-se bem na reformulação do gendarme econômico internacional e é dos socialistas com face capitalista. Portanto, confiável. E pasmem, Marine Le Pen está pronta para bater o pequeno Nicolas. E nesse sentido, o presidente da França está ameaçado de não entrar no segundo turno. E se isso ocorrer, o seu partido, o UMP, se dividirá entre a ultra-direita, o Partido da Front National e o Partido Socialista, com aparente e suave inclinação para o primeiro. A esquerda-esquerda parece desesperançada e cada vez mais sem munição, idéias e propostas. E ânimo. Contudo, o movimento social tende a se inclinar à esquerda, o que é paradoxal, mas indica que o tabuleiro político e ideológico, está a exigir das esquerdas uma reformulação de pensamento e de prática que não parecem em curso. Strauss-Kahn seria o coringa esquerda-capitalista.



O ARCO SINGULAR DE PORTUGAL



A crise portuguesa é vasta e está quebrando os azulejos dessa entrada da União Européia. E nos revela algo fundamental: Portugal é um país que cresceu por exclusiva integração com a Europa. E cresceu materialmente com uma básica infra-estrutura urbana de qualidade. Mas dominado pelo sistema financeiro e por uma capitalização estatal. O resultado desse processo foi uma vitória das finanças, apoiada pelo BCE, e uma corrupção incrível no campo do governo. Teremos, “já está lá”, o FMI – chamado por Boaventura Santos de “agência de segurança para os credores” – o que vai levar uma destruição da atual situação social portuguesa, baseada na idéia dos conservadores de que “os portugueses estão vivendo acima de suas posses”. O objetivo tem coloração nítida que é conseguir a renovação das finanças estatais, pela poupança e não pelo investimento e cujo final do filme já é conhecido: remodelar Portugal para que se torne fonte de novas vantagens aplicações dos bancos privados.



Na atual configuração internacional, Portugal é um lugar privilegiado para entender o artifício básico das finanças nacionais e internacionais: sugar os recursos do Estado, por meio da dívida e déficit, incentivando o descalabro e a corrupção da política. E depois dessa atuação econômica, as finanças geram via mídia e organismos internacionais, uma pressão econômica, baseadas, inclusive, nas agências de ratings. Essas funcionam como promotores de acusação e o FMI, em nome da saúde do país e da sociedade mundial, aplica sentenças que serão executadas por suas geralmente inflexíveis equipes. E a crise que era econômica e virou política, levou assim à necessidade lírica de “ajuda externa”. Temos então uma reviravolta da crise, que nem um trapezista de circo, ela, agora, dá um novo salto mortal e a política abdica de suas decisões para que haja uma solução econômica.



No entanto, crítico leitor, entendamos, você e eu, a perfídia da manobra. Essa solução econômica é, em verdade, um avanço político das finanças, porque o grande acusado passa a ser o Estado, sobretudo o fato conhecido: a corrupção dos políticos, o gasto excessivo com funcionários, as liberalidades evidentes dos encargos sociais, sobretudo os da saúde e previdenciários. O bilhete da aeronave da solução está entregue: vem o FMI, exige austeridade e sacrifícios – extremo rigor fiscal, dispensa de funcionários, diminuição do estatuto econômico dos aposentados, degradação dos serviços públicos, etc. Cortam-se os anéis; sim, sim, mas, não se deixam os dedos. Tiro certo: a privatização das empresas públicas. E se o país é frágil, faz-se como no tempo de FHC, a reestruturação do sistema financeiro local para sua maior eficácia no interior do sistema financeiro internacional. É perfeito como chantagem econômica, chantagem política. Tudo em nome do bem: reforma do teatro dos vícios.



Conclusão: a causa do desastre é a dinâmica das finanças, com sua expansão especulativa e predatória – vejam as especulações sobre o câmbio e as commodities. Mas a visibilidade social da crise se dá no campo da política. Os causadores dela são “os culpados de sempre”: o Estado e o povo – que vivem acima dos seus rendimentos. E no bar da sociedade, porque essa é uma solução de botequim, o preço é pago pelo Estado. Mas quem deu e dá e dará o dinheiro (e ficará sem bens materiais, financeiros e culturais) são os empregados públicos e privados, os desempregados, os aposentados, os pobres, os jovens, os imigrantes, etc. A fila é grande.




PS – Estava no Porto, quando Lula recebeu o título de Doctor Honoris Causa em Coimbra. Sucesso absoluto. A sua presença e o seu discurso ocuparam as primeiras páginas dos diários portugueses e ofuscaram a presença inglesa do príncipe Charles. O triunfo de Lula mostrou também o aumento de prestígio e de poder do Brasil. E todos ficaram comovidos com a palavra da Dilma, afirmando, com oportunidade política indiscutível, que o Brasil estaria disposto a ajudar a solucionar a crise de Portugal.