segunda-feira, fevereiro 09, 2009

AS FINANÇAS, O ESTADO E A CRISE AMERICANA por Enéas de Souza

O processo econômico que está se desmanchando é um só: o modelo de hegemonia financeira com a desmontagem de vários aspectos: alavancagem, organização do sistema bancário e do sistema não -bancário: alcance da intervenção do banco central, estrutura do crédito, o papel da securitização, a imensa multiplicação de produtos financeiros e as agências de ratings. Mas há algo especial, a incapacidade do sistema financeiro de amparar o sistema produtivo, seja pelo lado do financiamento da produção (equipamentos,inovações, tecnologia, etc.), seja pelo lado dos comercial papers, seja pelo lado do financiamento dos bens aos consumidores, seja pelo financiamento dos cartões de créditos, etc. Desta forma este modelo falhou tanto no lado financeiro quanto no lado produtivo. E, é preciso salientar, que nos dois setores, a dinâmica estourou pela superacumulação de capital, expressos na inflação de ativos financeiros bichados e pela considerável quantidade de bens produzidos pela indústria e tornados invendáveis. O desdobramento desse modelo de hegemonia financeira nos Estados Unidos, encadeou outros dois pontos importantes: um comércio internacional ancorado em déficits volumosos do comércio externo americano, sobretudo com a China; e recursos de capitais vindo do exterior, desta e dos países emergentes, para atraídos pelos títulos do Tesouro dos Estados Unidos que constituíram um segundo déficit, o déficit fiscal, que fez a dívida pública alcançar mais de 10 trilhões.
O desenho de quadro serve apenas para dizer o seguinte: a gravidade da crise, a partir deste novo governo, o governo Obama, não alterou significativamente a política do Estado para a economia. Ou seja, basta ver o comportamento da Secretaria do Tesouro e do Banco Central (o FED). Na verdade, estes dois pilares estatais continuam na antiga prioridade: salvar os bancos. Não é que o sistema não deva encontrar um formato de reformulação da função das finanças na economia. Mas, fica claro, no entanto, que o objetivo daquelas instituições não é certamente modificar a relação de forças entre as finanças e a produção (empresas e trabalhadores). Trata-se de recondicionar o sistema, dando tempo (!) para que a combalida área financeira volte a utilizar a economia a seu favor. Só que a crise vai continuar se desdobrando fortemente. Prova disso são os ativos tóxicos ainda não desativados, a insuficiência capitalização dos bancos, a crescente ameaça sobre os Hedge Funds, os Private equitys e os Fundos de Pensões, etc. Por isso, o duplo jogo das finanças emerge com nitidez: além do objetivo de ganhar tempo, elas precisam manter a disponibilidade do Estado em fornecer recursos para o funil insaciável e aparentemente intermiável do setor.
Por essas razões, o pacote americano dá apenas uma modesta contribuição para o relançamento das obras públicas ligadas à retomada da produção e do emprego, não chegando a 400 bilhões de dólares. Acrescenta-se a esses aspectos, a não existência, no plano, de um atendimento expressivo e consistente para a população que perdeu com as hipotecas imobiliárias. Ou seja, o pacote, na sua timidez, continua sob o império das finanças. Isso significa que os Estados Unidos podem ser punidos por concepções deste tipo, pois a solução hoje não pode ser das finanças para as finanças, com uma pequena contemporização para os demais setores. A solução passa por um Estado que organize coordenadamente a mutação da sociedade, atendendo os vastos problemas da produção, da renovação da matriz energética, das mutações tecnológicas, e sobretudo da combinação de todas as crises da economia e da sociedade com a crise ecológica.

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