sexta-feira, fevereiro 27, 2009

APRIL LOVE

Por Enéas de Souza



As declarações de Obama de que vai negociar um novo desenho do mundo econômico, em abril, no G-20, nos dá uma perspectiva de novas emoções no teatro das relações internacionais. E indica que o próximo período, pleno de peças dramáticas, vai ser um misto de atos de imposição e de negociação. Porque? Num sentido, os Estados Unidos, a partir do discurso de Obama, vão mudar completamente o jogo; como num campo de futebol, eles vão passar a bola do lado direito para outro lado, o lado esquerdo. Pretendem, fruto principal do presente desafio, transformar uma economia de acumulação financeira numa economia de acumulação produtiva. Percebem os críticos, os analistas e os leitores, que estamos na véspera histórica da tentativa de uma mutação estrutural profunda. O mundo vai mudar e a construção passará por um longo período de avanços e recuos.

Veja então o leitor: se seguirmos na direção do longo prazo, tudo vai estar sustentado, a meu ver, na substituição da infra-estrutura energética; de tal modo que vamos caminhar, nos próximos anos, para uma matriz composta de diversas energias. Uma matriz chamada de mista. Já que ela resultará da combinação das energias eólica, solar, nuclear, petrolífera, ou do hidrogênio, até atingirmos uma nova matriz com outra dominância. E essa marcha terá como efeito fatal, impulsionar e revolucionar a tecnologia de várias indústrias. Mesmo porque essas próprias indústrias terão que perseguir novos métodos, novas formas produtivas, novos produtos; não há como esconder, os seus lucros indispensáveis estão caindo. E os mercados precisam de produtos mais competitivos para que surjam os preciosos resultados que os empresários almejam tanto.

Na nossa civilização, um dos centros básicos da acumulação de capital é o abrangente mercado do automóvel. Qualquer mudança neste setor provoca a alteração em muitas coisas, inclusive no perfil de nossas cidades. Claro que no atual estado das tecnologias, a questão do aquecimento global vai exigir medidas e atitudes e instituições e empresas para suprirem as questões da área. Como se vê o que está em causa é a busca de um novo paradigma industrial - e até mesmo uma nova sociedade - cuja formatação os americanos esperam liderar.

A metamorfose do modelo atual de acumulação transfigura igualmente o conjunto dos mercados internacionais. E com isso as relações entre as nações. Relações que darão origem a novas posições dentro da hierarquia de uma possível e futura ordem, que não será alcançada sem perturbações, sem atritos, sem fragores. O que significa a reformulação e a criação de instituições para-estatais no campo internacional, como o FMI por exemplo, que terão que regular, fiscalizar, conduzir, direcionar esses novos processos econômicos. Só esse festival colorido de aspectos revela que deverá haver inúmeras e intensas discussões, se não combates, até mesmo conflitos demorados e belicosos para que um novo arranjo se estabeleça tanto na economia quanto na política. Este teatro shakespeariano começa, sob intensa expectativa, na reunião do G-20, como já dissemos logo ali em abril. Os mais cínicos e os mais céticos já dizem que esta peça tem nome – e nome irônico: April Love.

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