O ESTADO NA CONTRAMÃO DA CRISE MUNDIAL
Por Enéas de Souza
Uma visão atual da economia planetária é como um filme de suspense, onde a cena que dá medo, já está acontecendo. Claro os dois personagens principais da história, os Estados Unidos e a China, estão sendo atacados por um processo enorme de desvalorização de capital. E numa boa, o que é uma desvalorização de capital? Vamos então à explicação: o leitor sabe bem que quando uma economia, devido a uma intensa competição entre as empresas, desenvolve negócios financeiros e produz mercadorias em excesso, ela superacumula capital. A concorrência empresarial colocou no mercado, mais ativos reais e financeiros do que era possível, etc. No fundo, produziu mercadorias que não vão dar o lucro esperado para realizar o seu capital. Logo que se verifica a superacumulação de capital há um movimento da economia para desgastar o que foi produzido em superabundância, sejam títulos, sejam produtos. Se a área financeira visa desinflacionar os ativos tóxicos, no caso da indústria, a preocupação hoje é vender os produtos (carros, imóveis, roupas, máquinas, aço, etc.) pelo melhor preço que for possível; ao mesmo tempo, tem que eliminar os estoques, ajustando a produção ao ritmo da demanda cada vez menos presente.
Ou seja, no tiroteio da economia caem as corporações produtivas e financeiras, mas também caem os trabalhadores. Muito pior para estes do que para aqueles. Estas cenas têm a ver com a idéia de clímax, com a idéia de suspense como nos filmes de Hitchcock. Pois, o problema para as populações e para os capitalistas, é o tempo deste estado, a duração da crise. Quando o roteiro da crise é suave vivemos pequenas recessões. Mas se o roteirista pega com mão pesada, como os empresários financeiros e produtivos americanos no atual momento, as seqüências dos filmes podem ser muito intensas e extensas. E aí já temos uma crise agrandada. E de recessões brandas passamos a recessões duras, prolongadas, como é o caso que enfrentamos. E se o filme tem alta dramaticidade, as cenas fortes tornam-se mais agudas e descambam para uma vasta e estranguladora depressão.
E qual é o enredo deste roteiro e deste filme que estamos vivendo? O foco da intriga é a economia americana que vinha puxando todas as economias e articulava a sua produção com amplas importações da China e do resto mundo. Como em economia todas as coisas são interligadas, formando um sistema, uma totalidade, a parada americana provocou uma contaminação e uma contração que se espalhou para todos os lugares, por todo o mundo. Vejamos rapidamente os estragos, num plano geral podemos mostrar que o PIB do quarto semestre de 2008 sofreu uma queda bárbara em vários lugares: os Estados Unidos caíram 6,2%, o Japão 12%, a Alemanha 8%, Coréia do Sul 20%, por exemplo.
A cena inicial foi a crise do subprimes em 2007, que se incrementou na crise financeira e produtiva de 2008. E ela veio vindo, foi se transformando, aos solavancos, foi se desdobrando, aos pulos e sobrou para a Inglaterra, Espanha, França, Irlanda, etc., chegando, agora, a criar uma crítica situação na Europa do Leste. Na Ásia, uma das primeiras repercussões foi a interrupção das importações que os americanos faziam de produtos chineses. E a China, que por sua vez encadeava a produção de várias nações por intermédio do seu comércio exterior (inclusive o Brasil), deteve os seus impulsos e escasseou as suas próprias importações, embora mantivesse a política de ter poderosos saldos comerciais, diversificando o envio de seus bens para a Europa. Com isso, a China tenta manter sua posição de força, ou seja, acumular reservas, o que causa fortes problemas para os próprios países da região asiática. Nesse sentido, a Ásia, que a partir da crise de 97 tornou-se uma economia ligada às exportações, tem sofrido fortemente com o freio das importações chinesas e norte-americanas. Tudo veio abaixo, desde o Japão a Coréia do Sul, passando por Taiwan.
O que queremos frisar nesta rápida descrição é o encadeamento da crise, que se enrosca ladeira abaixo, mas acaba por isolar os países, desarmando a mundialização. Este fenômeno se chama de descendente cíclica, causado pela múltipla e internacional superacumulação de capital que passa por todas as economias. Ou seja, a cena do tiroteio atinge a todos os personagens, a todos os países que estão no set de filmagem. Há uma contração geral tanto nas economias nacionais como no comércio internacional. O que torna a coisa crítica é que as possíveis reações dos personagens podem se fazer sob várias formas desagregadoras: fechamento das economias, protecionismo, guerra de preços, desvalorizações monetárias, etc. Isto está no ar, faz parte da atmosfera da película, mas a sua presença na cena ainda não se impôs como uma tendência definitiva. Há uma margem de negociação. E depende, para tal, do que vão fazer diversas importantes figuras dramáticas como os Estados Unidos e a China, a Alemanha e a Inglaterra, etc. Vai haver a rodada de uma filmagem decisiva, em abril, a famosa reunião dos G-20. Nela, os países vão tentar se entender numa outra arena, a mesa de negociações onde além da economia entra a política, uma relação de forças que se expressa em comportamentos de poder e de conflito.
A economia e a política vão dançar a música das uniões e das adversidades. Cada um vai tentar puxar a corda para o seu lado. Porém, o quadro do que foi instalado continuará sua composição de forças tendenciosamente sombria. A contração das economias pode aumentar, mas há, no entanto, pelo menos uma força que vai se contrapor às forças negativas, uma força afirmativa, a presença intervencionista dos Estados. Ela já é visível no pacote americano, nos gastos do governo chinês, nos investimentos do PAC, etc. Todos, gastos públicos em infra-estrutura, que são intervenções contra-cíclicas. Porque a estratégia é só uma: jogar contra a velocidade de queda uma contra-força que faça a tendência declinante mudar de rumo. Primeiro, o seu objetivo é atenuar e parar a sua queda e depois forçar a ascensão da curva do ciclo. Ela é ainda muito tímida, muito adolescente, mas já é um começo. Só que a nossa ânsia de solução é muito maior do que o atual poder de reversão do movimento de contração, de isolamento e de declínio das economias nacionais, regionais continentais e da economia mundial.
Por Enéas de Souza
Uma visão atual da economia planetária é como um filme de suspense, onde a cena que dá medo, já está acontecendo. Claro os dois personagens principais da história, os Estados Unidos e a China, estão sendo atacados por um processo enorme de desvalorização de capital. E numa boa, o que é uma desvalorização de capital? Vamos então à explicação: o leitor sabe bem que quando uma economia, devido a uma intensa competição entre as empresas, desenvolve negócios financeiros e produz mercadorias em excesso, ela superacumula capital. A concorrência empresarial colocou no mercado, mais ativos reais e financeiros do que era possível, etc. No fundo, produziu mercadorias que não vão dar o lucro esperado para realizar o seu capital. Logo que se verifica a superacumulação de capital há um movimento da economia para desgastar o que foi produzido em superabundância, sejam títulos, sejam produtos. Se a área financeira visa desinflacionar os ativos tóxicos, no caso da indústria, a preocupação hoje é vender os produtos (carros, imóveis, roupas, máquinas, aço, etc.) pelo melhor preço que for possível; ao mesmo tempo, tem que eliminar os estoques, ajustando a produção ao ritmo da demanda cada vez menos presente.
Ou seja, no tiroteio da economia caem as corporações produtivas e financeiras, mas também caem os trabalhadores. Muito pior para estes do que para aqueles. Estas cenas têm a ver com a idéia de clímax, com a idéia de suspense como nos filmes de Hitchcock. Pois, o problema para as populações e para os capitalistas, é o tempo deste estado, a duração da crise. Quando o roteiro da crise é suave vivemos pequenas recessões. Mas se o roteirista pega com mão pesada, como os empresários financeiros e produtivos americanos no atual momento, as seqüências dos filmes podem ser muito intensas e extensas. E aí já temos uma crise agrandada. E de recessões brandas passamos a recessões duras, prolongadas, como é o caso que enfrentamos. E se o filme tem alta dramaticidade, as cenas fortes tornam-se mais agudas e descambam para uma vasta e estranguladora depressão.
E qual é o enredo deste roteiro e deste filme que estamos vivendo? O foco da intriga é a economia americana que vinha puxando todas as economias e articulava a sua produção com amplas importações da China e do resto mundo. Como em economia todas as coisas são interligadas, formando um sistema, uma totalidade, a parada americana provocou uma contaminação e uma contração que se espalhou para todos os lugares, por todo o mundo. Vejamos rapidamente os estragos, num plano geral podemos mostrar que o PIB do quarto semestre de 2008 sofreu uma queda bárbara em vários lugares: os Estados Unidos caíram 6,2%, o Japão 12%, a Alemanha 8%, Coréia do Sul 20%, por exemplo.
A cena inicial foi a crise do subprimes em 2007, que se incrementou na crise financeira e produtiva de 2008. E ela veio vindo, foi se transformando, aos solavancos, foi se desdobrando, aos pulos e sobrou para a Inglaterra, Espanha, França, Irlanda, etc., chegando, agora, a criar uma crítica situação na Europa do Leste. Na Ásia, uma das primeiras repercussões foi a interrupção das importações que os americanos faziam de produtos chineses. E a China, que por sua vez encadeava a produção de várias nações por intermédio do seu comércio exterior (inclusive o Brasil), deteve os seus impulsos e escasseou as suas próprias importações, embora mantivesse a política de ter poderosos saldos comerciais, diversificando o envio de seus bens para a Europa. Com isso, a China tenta manter sua posição de força, ou seja, acumular reservas, o que causa fortes problemas para os próprios países da região asiática. Nesse sentido, a Ásia, que a partir da crise de 97 tornou-se uma economia ligada às exportações, tem sofrido fortemente com o freio das importações chinesas e norte-americanas. Tudo veio abaixo, desde o Japão a Coréia do Sul, passando por Taiwan.
O que queremos frisar nesta rápida descrição é o encadeamento da crise, que se enrosca ladeira abaixo, mas acaba por isolar os países, desarmando a mundialização. Este fenômeno se chama de descendente cíclica, causado pela múltipla e internacional superacumulação de capital que passa por todas as economias. Ou seja, a cena do tiroteio atinge a todos os personagens, a todos os países que estão no set de filmagem. Há uma contração geral tanto nas economias nacionais como no comércio internacional. O que torna a coisa crítica é que as possíveis reações dos personagens podem se fazer sob várias formas desagregadoras: fechamento das economias, protecionismo, guerra de preços, desvalorizações monetárias, etc. Isto está no ar, faz parte da atmosfera da película, mas a sua presença na cena ainda não se impôs como uma tendência definitiva. Há uma margem de negociação. E depende, para tal, do que vão fazer diversas importantes figuras dramáticas como os Estados Unidos e a China, a Alemanha e a Inglaterra, etc. Vai haver a rodada de uma filmagem decisiva, em abril, a famosa reunião dos G-20. Nela, os países vão tentar se entender numa outra arena, a mesa de negociações onde além da economia entra a política, uma relação de forças que se expressa em comportamentos de poder e de conflito.
A economia e a política vão dançar a música das uniões e das adversidades. Cada um vai tentar puxar a corda para o seu lado. Porém, o quadro do que foi instalado continuará sua composição de forças tendenciosamente sombria. A contração das economias pode aumentar, mas há, no entanto, pelo menos uma força que vai se contrapor às forças negativas, uma força afirmativa, a presença intervencionista dos Estados. Ela já é visível no pacote americano, nos gastos do governo chinês, nos investimentos do PAC, etc. Todos, gastos públicos em infra-estrutura, que são intervenções contra-cíclicas. Porque a estratégia é só uma: jogar contra a velocidade de queda uma contra-força que faça a tendência declinante mudar de rumo. Primeiro, o seu objetivo é atenuar e parar a sua queda e depois forçar a ascensão da curva do ciclo. Ela é ainda muito tímida, muito adolescente, mas já é um começo. Só que a nossa ânsia de solução é muito maior do que o atual poder de reversão do movimento de contração, de isolamento e de declínio das economias nacionais, regionais continentais e da economia mundial.
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