A CASA BRANCA,
O TESOURO E O FED
Por Enéas de Souza
Parece que não há clareza da decisão
A dinâmica da economia financeira está num momento decisivo diante das dificuldades para resolver a questão. A dinâmica levou a necessidade de resolver alguns problemas: 1) problemas com a capitalização e o balanço dos grandes bancos; 2) problemas renovados com Fanny Mae e Freddy Mac em função de novas perdas; 3) as crescentes e renovadas perdas da AIG, verdadeiro saco sem fundo para aportes do Tesouro; 4) problemas dos bônus dos altos administradores das empresas apoiadas pelo Tesouro. A questão dos bônus da AIG causou celeuma no Congresso, levou a intervenção de Obama exigindo que o Tesouro encontrasse uma solução legal para a eliminação deste ponto, etc.
Sentimos que Geithner está diante de problemas extremamente difíceis que a dinâmica financeira trouxe à praia: 1) como resolver a questão dos ativos podres dentro dos balanços (sendo que a solução preferida parece ser a adoção do “bad bank” para uma gerência pública de ativos); 2) quais são os bancos que poderão encontrar uma boa estrutura de capitalização; 3) o que fazer com aqueles que são insolventes, que terão que ser fechados ou nacionalizados. Como dizia um antigo personagem de Losey: “Decisions, always decisions!”.
Como chefe da economia americana, Geithner enfrenta mais dois grandes problemas: como enfrentar a crise econômica da área produtiva, sobretudo a questão da indústria automobilística, onde nos parece que permanece uma indefinição sobre as diversas formas de agir. E, naturalmente, como resolver adequadamente as questões vinculadas ao endividamento das famílias nas hipotecas imobiliárias. Dito isso, questões que estão nebulosas para os observadores e mesmo para os congressistas americanos, há um problema fundamental para o qual Geithner não disse nada: como relançar a economia produtiva no caminho da acumulação do capital.
The long hot Summers
É neste último ponto que o Tesouro recebe o ataque mais frontal e de dentro da Casa Branca. O assessor de Obama, Lawrence Summers sempre um candidato a substituir Geithner, e que conhece bem o cargo porque foi o imediato de Rubin, o primeiro secretário do Tesouro de Clinton, e ele mesmo terminou por substituir ao antigo titular. Pois, este gênio do mal, este camaleão dos cargos econômicos como é dito em outras áreas, lançou com ponto fundamental da economia de Obama a necessidade da sustentação da demanda seja na economia americana, seja na economia mundial.
Numa olhada, para quem observa de fora, as trapalhadas desse início do governo Obama, percebe que esta é uma proposta sensata, pois Summers propõe tanto o gasto fiscal de 2% do PIB na economia americana, como que os governos de todo o mundo ajam do mesmo modo. Isto significa que Summers penetra na seara keynesiana e, pragmaticamente, se coloca dentro da visão de Obama. De um lado, a necessidade de pôr a economia produtiva em andamento e em segundo lugar preparar, via o resto do mundo, um mercado para a economia americana. Como já dissemos em nossas postagens, o objetivo de Obama é relançar a economia americana como exportadora. E preparar para o futuro, num segundo tempo, após inúmeras pesquisas, que ela possa transformar a base energética da produção articulada com tecnologias novas e adequadas a esta nova infra-estrutura da energia.
Vendo este lance de Summers, apoiado inclusive por inúmeras personalidades nacionais e internacionais, inclusive o colunista do Financial Times, Martin Wolf, a gente poderia fazer uma paródia de uma obra de William Faulkner que Martin Ritt filmou chamada: The long hot Summer”. Basta troca Summer por Summers para definir a situação.
(Te cuida, Geithner, tem gente de olho no teu cargo!)
O doce, calvo e barbudo Bernanke
Pois quem soube retirar-se para um plano mais discreto foi Bernanke. Percebeu que o FED é um órgão regulador, que embora não regulasse quase nada, Bernanke poderia solicitar que o Congresso desse, com urgência, um marco regulatório, uma reforma significativa para a estrutura financeira, que fosse considerada como “top priority”. Enquanto isso não acontece, vai fazendo o que pode: compra de “Tresury securities” e mais que dobrou as “mortgages related securities”. E afirmou que se sentia encorajado pela aprovação dos mercados com essas medidas.
E se a gente lê nas observações do André Scherer, o aumento de capital do FED vem mostrar a incrível situação de piora da crise financeira. Porque Bernanke não só aumenta o capital do FED, como toma medidas para compra de títulos do Tesouro e dos títulos hipotecários, como amplia a sua ação, solicitando ao Congresso uma urgência para a aprovação de medidas regulatórias para o sistema. E ele nos dá a razão fundamental: as instituições financeiras estão tão interligadas, tão coladas umas às outras, que elas são “too big or too interconnected to fail”. Ou seja, o sistema financeiro, no final do processo de acumulação desregulada, se misturou tanto que constituiu uma vasta e enorme salada de ativos e títulos podres, espalhando confusão por toda parte. E Bernanke não nos disse apenas isso, nos disse mais duas conseqüências desta interconexão: a primeira, é que não há possibilidade de fazer uma falência ordenada dessas grandes corporações financeiras e a segunda, que no atual sistema não haveria alternativa para prevenir essas perturbações, essas turbulências e esses fracassos que ocorreram. É assustador sim, e profundamente grave o depoimento do doce, calvo e barbudo, Bernanke, como assinalaria o nosso Nelson Rodrigues.
(Com o cargo assegurado, Bernanke acabou ficando na dele. Deixa o Geithner e o Summers se matarem).
O ninho de cobras
A crise vem mostrando a sua face aguda. Chegou a um ponto em que se pode depreender que o sistema financeiro como um todo está falido. Não é novidade, mas é apenas a compreensão de que a mudança é complexa. E a necessidade da reconstrução do sistema passa por decisões do Estado, seja do executivo, seja do legislativo, alterações que envolvem múltiplas lutas econômicas e burocráticas, lutas onde parece não haver um grupo com maioria suficiente para sustentar uma transformação das perdas, nem a metamorfose para uma nova saída.
Somente a idéia de que é preciso lançar a recuperação da demanda, pode dar, primeiro, um passo nacional e mundial importante e, segundo, um tempo para que as forças econômicas e sociais possam definir quem vai ganhar nesta batalha das trevas nas finanças. Talvez, somente as modificações produtivas possam exigir e assegurar uma determinada construção de um novo sistema de crédito. Por isso, que a nacionalização – medida descartada por Geithner – daria um passo à frente, eliminando os vencedores perdedores, e possibilitando um plano de recuperação para a economia americana. Mas, a nacionalização seria de fato um imenso problema para a auto-imagem dos Estados Unidos e a consagração política da derrocada das finanças. Isto talvez ainda seja inaceitável no atual estado das lutas econômicas. Mas, o G-20 vai botar mais fogo na questão. O que dirão os credores dos americanos – dos chineses aos árabes? Não está vindo aí a galope, não há na atmosfera um cheiro, como reverso desta pressão, de um calote, de um gigantesco calote, só que, desta vez, dos americanos?
Por Enéas de Souza
Parece que não há clareza da decisão
A dinâmica da economia financeira está num momento decisivo diante das dificuldades para resolver a questão. A dinâmica levou a necessidade de resolver alguns problemas: 1) problemas com a capitalização e o balanço dos grandes bancos; 2) problemas renovados com Fanny Mae e Freddy Mac em função de novas perdas; 3) as crescentes e renovadas perdas da AIG, verdadeiro saco sem fundo para aportes do Tesouro; 4) problemas dos bônus dos altos administradores das empresas apoiadas pelo Tesouro. A questão dos bônus da AIG causou celeuma no Congresso, levou a intervenção de Obama exigindo que o Tesouro encontrasse uma solução legal para a eliminação deste ponto, etc.
Sentimos que Geithner está diante de problemas extremamente difíceis que a dinâmica financeira trouxe à praia: 1) como resolver a questão dos ativos podres dentro dos balanços (sendo que a solução preferida parece ser a adoção do “bad bank” para uma gerência pública de ativos); 2) quais são os bancos que poderão encontrar uma boa estrutura de capitalização; 3) o que fazer com aqueles que são insolventes, que terão que ser fechados ou nacionalizados. Como dizia um antigo personagem de Losey: “Decisions, always decisions!”.
Como chefe da economia americana, Geithner enfrenta mais dois grandes problemas: como enfrentar a crise econômica da área produtiva, sobretudo a questão da indústria automobilística, onde nos parece que permanece uma indefinição sobre as diversas formas de agir. E, naturalmente, como resolver adequadamente as questões vinculadas ao endividamento das famílias nas hipotecas imobiliárias. Dito isso, questões que estão nebulosas para os observadores e mesmo para os congressistas americanos, há um problema fundamental para o qual Geithner não disse nada: como relançar a economia produtiva no caminho da acumulação do capital.
The long hot Summers
É neste último ponto que o Tesouro recebe o ataque mais frontal e de dentro da Casa Branca. O assessor de Obama, Lawrence Summers sempre um candidato a substituir Geithner, e que conhece bem o cargo porque foi o imediato de Rubin, o primeiro secretário do Tesouro de Clinton, e ele mesmo terminou por substituir ao antigo titular. Pois, este gênio do mal, este camaleão dos cargos econômicos como é dito em outras áreas, lançou com ponto fundamental da economia de Obama a necessidade da sustentação da demanda seja na economia americana, seja na economia mundial.
Numa olhada, para quem observa de fora, as trapalhadas desse início do governo Obama, percebe que esta é uma proposta sensata, pois Summers propõe tanto o gasto fiscal de 2% do PIB na economia americana, como que os governos de todo o mundo ajam do mesmo modo. Isto significa que Summers penetra na seara keynesiana e, pragmaticamente, se coloca dentro da visão de Obama. De um lado, a necessidade de pôr a economia produtiva em andamento e em segundo lugar preparar, via o resto do mundo, um mercado para a economia americana. Como já dissemos em nossas postagens, o objetivo de Obama é relançar a economia americana como exportadora. E preparar para o futuro, num segundo tempo, após inúmeras pesquisas, que ela possa transformar a base energética da produção articulada com tecnologias novas e adequadas a esta nova infra-estrutura da energia.
Vendo este lance de Summers, apoiado inclusive por inúmeras personalidades nacionais e internacionais, inclusive o colunista do Financial Times, Martin Wolf, a gente poderia fazer uma paródia de uma obra de William Faulkner que Martin Ritt filmou chamada: The long hot Summer”. Basta troca Summer por Summers para definir a situação.
(Te cuida, Geithner, tem gente de olho no teu cargo!)
O doce, calvo e barbudo Bernanke
Pois quem soube retirar-se para um plano mais discreto foi Bernanke. Percebeu que o FED é um órgão regulador, que embora não regulasse quase nada, Bernanke poderia solicitar que o Congresso desse, com urgência, um marco regulatório, uma reforma significativa para a estrutura financeira, que fosse considerada como “top priority”. Enquanto isso não acontece, vai fazendo o que pode: compra de “Tresury securities” e mais que dobrou as “mortgages related securities”. E afirmou que se sentia encorajado pela aprovação dos mercados com essas medidas.
E se a gente lê nas observações do André Scherer, o aumento de capital do FED vem mostrar a incrível situação de piora da crise financeira. Porque Bernanke não só aumenta o capital do FED, como toma medidas para compra de títulos do Tesouro e dos títulos hipotecários, como amplia a sua ação, solicitando ao Congresso uma urgência para a aprovação de medidas regulatórias para o sistema. E ele nos dá a razão fundamental: as instituições financeiras estão tão interligadas, tão coladas umas às outras, que elas são “too big or too interconnected to fail”. Ou seja, o sistema financeiro, no final do processo de acumulação desregulada, se misturou tanto que constituiu uma vasta e enorme salada de ativos e títulos podres, espalhando confusão por toda parte. E Bernanke não nos disse apenas isso, nos disse mais duas conseqüências desta interconexão: a primeira, é que não há possibilidade de fazer uma falência ordenada dessas grandes corporações financeiras e a segunda, que no atual sistema não haveria alternativa para prevenir essas perturbações, essas turbulências e esses fracassos que ocorreram. É assustador sim, e profundamente grave o depoimento do doce, calvo e barbudo, Bernanke, como assinalaria o nosso Nelson Rodrigues.
(Com o cargo assegurado, Bernanke acabou ficando na dele. Deixa o Geithner e o Summers se matarem).
O ninho de cobras
A crise vem mostrando a sua face aguda. Chegou a um ponto em que se pode depreender que o sistema financeiro como um todo está falido. Não é novidade, mas é apenas a compreensão de que a mudança é complexa. E a necessidade da reconstrução do sistema passa por decisões do Estado, seja do executivo, seja do legislativo, alterações que envolvem múltiplas lutas econômicas e burocráticas, lutas onde parece não haver um grupo com maioria suficiente para sustentar uma transformação das perdas, nem a metamorfose para uma nova saída.
Somente a idéia de que é preciso lançar a recuperação da demanda, pode dar, primeiro, um passo nacional e mundial importante e, segundo, um tempo para que as forças econômicas e sociais possam definir quem vai ganhar nesta batalha das trevas nas finanças. Talvez, somente as modificações produtivas possam exigir e assegurar uma determinada construção de um novo sistema de crédito. Por isso, que a nacionalização – medida descartada por Geithner – daria um passo à frente, eliminando os vencedores perdedores, e possibilitando um plano de recuperação para a economia americana. Mas, a nacionalização seria de fato um imenso problema para a auto-imagem dos Estados Unidos e a consagração política da derrocada das finanças. Isto talvez ainda seja inaceitável no atual estado das lutas econômicas. Mas, o G-20 vai botar mais fogo na questão. O que dirão os credores dos americanos – dos chineses aos árabes? Não está vindo aí a galope, não há na atmosfera um cheiro, como reverso desta pressão, de um calote, de um gigantesco calote, só que, desta vez, dos americanos?
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