29 de abril de 2010
COLUNA DAS QUINTAS
DA CRISE GREGA
ÀS FINANÇAS:
PERGUNTAS,
SEMPRE PERGUNTAS
Por Enéas de Souza
A QUESTÃO GREGA
1) A Grécia está numa enrascada violenta. Uma dívida colossal, com muita pressão de curto prazo, em função do vencimento de parcelas. Esta pressão tem uma companhia de coloração negra, já que nos mercados existe um movimento especulativo contra os títulos helênicos. Está no horizonte, muito enrolada, uma ajuda dos países da Comunidade Européia. Só que esta ação tem um correlato, uma imensa pressão para que sejam definidas as condições dos empréstimos. E a campeã destas exigências é a loira Alemanha (cujos bancos estão atolados em ativos originados da dívida impagável). E, como um personagem que parece um corvo, está presente o FMI, o que assegura uma turbulência grande nos palcos políticos da Grécia, uma mobilização interna da população grega contra o governo, contra o FMI, contra os alemães, etc..
2) De um lado, para a Europa o problema é sério. Vejamos com mais detalhes. / Primeiro, se a Grécia não honrar suas dívidas, os bancos, a Europa, o euro, etc., além da própria Grécia, vão ficar abalados criticamente. Fala-se que a Alemanha tem 28 bilhões de euros em títulos gregos, a França, surpreendentemente tem uma cota maior, 50 bilhões e a Itália, 20 bi. A fotografia parece clara: o cachorro vai sim, morder o seu próprio rabo. / Segundo, se a Grécia aceitar as condições da Comunidade européia, ela e sua população vão atravessar um longo período de sofrimento, pois além de queda no PIB e da baixa do padrão de vida, pode ocorrer o aumento de impostos como já houve uma baixa de salários. E perdendo, através das condicionalidades, o controle fiscal, nada poderá ser feito pelos gregos, porque não podendo desvalorizar a moeda, que é européia, para exportar mais, acabaria com qualquer resquício de política econômica. Seria uma longa guerra de Tróia, só que com os antigos invasores, hoje, sitiados de dentro da fortaleza. / Terceiro, se ocorrer o fracasso da solução da dívida grega, todo mundo verá a continuação de um processo de especulação contra os países com altos déficits públicos. Isso seria feito através de uma progressiva e candente alta dos juros contra os títulos nacionais, até torná-los inegociáveis. Nessa direção, Portugal já está na borda do abismo, sabendo-se que depois de Portugal, são candidatos a Espanha (que teve a sua nota, ontem, quarta-feira, rebaixada pela Standard & Poor´s), a Irlanda, a Itália.,etc. Este processo poderia ser nomeado de o itinerário da pólvora e se constituiria numa espiral explosiva devastadora. / E quarto, se ouvirmos os mais catastrofistas, o observador consegue enxergar o rastilho destas dívidas, fulgurante, cujo elo final da cadeia seria a Inglaterra e os Estados Unidos.
3) A melodia da crise está esboçada: os seus compassos financeiros atingiriam o tom de uma profunda crise fiscal. E, por sua vez, esta devolveria às finanças o impulso para uma crise mais vasta, que culminaria numa falência do Estado, envolvendo um climax dramático de crise monetária. Na ordem das coisas, o euro tombaria primeiro. E, num segundo momento, numa etapa mais distante, viria o crepúsculo, o dólar desabaria. Parece, contudo, que estamos longe disso, mas certamente decidir bem a questão da Grécia, será um passo para deter este movimento. Teria se trabalhado para a interrupção desta cadeia de incêndio, desta força imperativa cujo termino seria, inevitávelmente, a depressão. No entanto, as perguntas são: serão atendidas as reivindicações da Grécia? E, por conseqüência, se encaminharão bem as soluções para as demais nações ameaçadas? Por outro lado, querem os europeus mesmo defender o euro? Não estará se formando um movimento de destruição econômica e política da Comunidade Européia? Se a Europa se for, os Estados Unidos terão, sem sombras de dúvidas, o dólar ameaçado? Serão os financistas e os políticos suscetíveis a uma ameaça sistêmica à economia? Será o Estado americano capaz de bloquear este escorregador do desastre que vai dar na areia do dólar?
O SISTEMA FINANCEIRO ESTÁ EM CHAMAS?
1) Obama conseguiu reunir energias para fazer uma ação contra o sistema financeiro. Foi a Nova Iorque, na semana passada, para dar um recado. “Join us”. Ou seja, está clamando por uma resposta positiva às suas propostas de reforma do sistema. Diga-se de passagem, reformas tímidas, mas que cheiram como um começo. Porém, a raça inflexível dos financistas está de ouvido fechado. Ouvem, mas não escutam. Os seus auriculares não captam estas vozes e esta ópera. O contra-ataque de Obama já está ocorrendo desde o verão americano do ano passado, de modo ritmado. Destacam-se dois pontos evidentes: o “Regulatory Finantial Reform”, com uma proposta de negociação dessas reformas e a “Volker rule”, tentando conter o desbragamento financeiro.
2) Só que no desdobramento de muitas escaramuças, apareceu, recentemente, uma cena dramática: a ação independente da SEC (apesar dos desmentidos de que tenha havido interferência do Obama) contra os bancos. O alvo inicial foi o Goldman Sacks, esta pantera financeira. Mas, claro estava na mira um certo Blankfein, turbulento, arrogante e ganancioso chefe desta instituição. E o problema se proclamou em cor berrante, a Goldman Sachs teria dado um passo em falso, agindo fraudulentamente no começo da crise financeira de 2007. Ora, os financistas não estão apenas lutando na concorrência dos mercados. Usam, como quem lava as mãos no banheiro, as armas que possuem: a mídia e os lobbies. E a publicidade é obvia: tudo contra a regulação! O que é que esse cara (o Obama) está querendo, fazer o seu nome às nossas custas?
3) Pois, como se viu, a desregulação é um incentivo à turbulência anunciada, à facilidade de ganhos financeiros ilícitos. Dando uma recuada no panorama, a pergunta fica nítida e exuberante: as finanças que se recuperaram - ao menos no curto prazo dos impactos da crise, através dos “bailouts” do Estado - tem disposição agora para negociar, justamente quando voltaram a jogar de mão? Ou ainda dito numa forma diferente: será necessário um outro Lehman Brothers - a metáfora básica da crise financeira - para que então sim, as finanças aceitem sentar à mesa de negociações com intuito de buscar uma nova realidade, uma nova arquitetura do sistema, uma nova função? Somando tudo isso, Grécia, Europa, impasse na regulação dos bancos, outras indagações surgem. O sistema financeiro está indo para o espaço? Será que Obama não tinha razão, quando disse no começo de sua gestão aos banqueiros: “Eu sou a salvação de vocês”? Esta frase seria lenda ou “bene trovato”?