As palavras “contida” e “superada” já foram utilizadas inúmeras vezes desde o início da crise financeira mundial, ainda em setembro de 2007, sempre com o intuito de demonstrar seu caráter passageiro, como a anunciar uma iminente volta à normalidade e ao business as usual. Isso ocorreu com Bernanke anunciando a “contenção do problema hipotecário-imobiliário estadunidense no pequeno e desimportante mercado subprime em outubro de 2007”, com a “solução” dada à falência do banco de investimentos Bear Stearns em março de 2008 e com a inundação de dólares promovida pelo FED após a falência do Lehman Brothers, em outubro de 2008, sem que o transcurso de agravamento da crise fosse substancialmente alterado.
Dos Estados Unidos, dados mecanismos de contágio diretos e indiretos, a crise se propagou para a Europa. Ainda em 2009, o infame acrônimo PIGS foi cunhado pelos bancos de investimento para apontar os países “bola da vez” para ataques especulativos. Nascia uma “nova periferia européia”, designando os sócios minoritários da União Europeia e do Euro. Assim, com velocidade espantosa, Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha (dos quais se aproxima perigosamente a Itália) foram rebaixados de promotores do “milagre europeu” a párias com condução fiscal temerária, dado o rápido agravamento de suas relações dívida/PIB, decorrentes tanto das crescentes dificuldades de financiamento de uma dívida pública substancialmente inchada pela incorporação pelos Estados de créditos fracassados do setor financeiro privado, quanto das perdas na arrecadação de impostos causada pela queda da economia mundial.
Em maio de 2010, a deterioração da possibilidade de financiamento desses países pelo “mercado” levou a criação do European Financial Stability Fund (EFSF), baseado em uma troca de dívida “podre” dos países em dificuldade por dívida lastreada em títulos da União Europeia, em uma inflexão forçada da política do Banco Central Europeu (BCE), fortemente influenciado pela posição alemã de não apoiar aportes financeiros públicos aos países endividados. Fortes compromissos fiscais foram exigidos dos países da “nova periferia europeia”, os quais permitiram acesso a recursos do EFSF e do FMI. Novamente, a crise foi então dada como resolvida. Entretanto, 2011 marca o aprofundamento das dificuldades de acesso ao crédito privado para esses países, com os spreads pagos em relação aos títulos alemães para rolagem das dívidas da Grécia, Portugal e Irlanda batendo novos records quase diariamente. Em situação desesperadora, um novo plano para evitar um default da Grécia é concebido in extremis. Uma novidade se soma aos pacotes anteriores: além de medidas draconianas de austeridade fiscal, da participação da ECB e do FMI, também os bancos credores são chamados a “colaborar” com o alongamento dos prazos de cobrança da dívida grega. Mais um passo é assim dado, com admissão de prejuízos potenciais ao já combalido setor bancário dos países “centrais” da Europa, possibilidade ainda não aventada anteriormente.
Dará certo dessa vez? As dificuldades são imensas e tornam desprezível essa possibilidade. No caso em tela, as agências de rating ameaçam seguir rebaixando a nota de crédito dos “novos países periféricos europeus” (o que já fizeram com Portugal dia 5 de julho), - o que levaria a desmoronar de vez a frágil arquitetura financeira de troca de títulos sobre a qual se embasa o esquema de rolagem da dívida desses países -; o “risco político” com a as justas manifestações das populações atingidas apenas aumentaria e a possibilidade de atingir as metas fiscais compromissadas inexistiria.
É mais correto imaginar que se trata de mais um aperto no parafuso de uma nova-velha crise de proporções espetaculares, tantas vezes dada como superada, tantas vezes insistente no (res)surgir. A solução passa por enjaular de vez a finança e a especulação financeira para libertar os povos. Alguém se habilita?
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