quinta-feira, janeiro 27, 2011

CRISE FINANCEIRA MUNDIAL
27 de janeiro de 2011
Coluna das Quintas


NÃO ME ENROLA, OBAMA!
Por Enéas de Souza


Obama, senti você um tanto desesperado na sua aparição no State of Nation. E você tem razão. O problema é que você deixou as finanças fazerem o seu próprio jogo. O Bush tinha feito uma salvação dos bancos, com o Paulson, aquele cara parecido com o André Contri. E você foi atrás, fez um segundo bailout. Sei, sei, se não fosse assim o tal de risco sistêmico cairia em cima de você e dos Estados Unidos. Mas, acho que você jogou mal. Porque deu toda a grana para as finanças e deu muito estímulo para a economia. Claro, você responderia, que fez no limite do possível. Mas convenhamos, Obama, o Krugman já tinha dito que o estímulo fiscal para a retomada da atividade era muito pouco. E aí, Obama, você se ralou. Você fez um keynesianismo muito envergonhado porque ajudou as finanças a temperarem as suas dívidas e a sua contabilidade, e o Ben (Ben Bernake) depois, agora mais no fim de 2010, jogou o regador do FED, dando mais dinheiro para proporcionar maior crédito ao sistema bancário. Mas, claro, os bancos não são bobos. E foram alegremente para a especulação. Esses caras têm aversão ao crédito à produção, Obama. E o teu estímulo às indústrias, à pesquisa foram um riozinho, um córrego para alimentar a recuperação da economia.

E agora, claro, com um déficil fiscal avolumado, com uma dívida pública gigantesca, tivestes que entrar no jogo deles. Qual é o jogo? Desregulamentação, dinheiro público para o sistema financeiro, cortes fiscais, aperto no funcionalismo público, etc. Aquelas coisas dos neoliberais. Aquelas coisas que infelicitam os trabalhadores. O Krugman sempre te pediu mais investimentos públicos, audácia nos gastos públicos para reativar a economia, e por conseqüência, fornecer mais arrecadação e, sobretudo, dar mais emprego. Mas, você agora está quase de joelhos. Você está tendo que pedir que as empresas façam investimento privado, façam inovação. Você, politicamente, não só ficou nas mãos dos financistas como dos industriais. E isto é tão verdade que você colocou no Conselho da Casa Branca, um cara do JP Morgan, e no novo Conselho onde estava o Volker, o Immelt que é da GE, que tem por trás uma instituição financeira, a GE Capital. Agora, aquela dúvida que a gente tinha que Michele podia ser do lado das finanças, agora a dúvida pode ser mais ampla. Alguns que lhe apoiaram estão perguntando se você não passou para o lado deles.

Ora, Obama, todo mundo sabe, você está desesperado. Você está na segunda metade do primeiro mandato, você tem que ser valente, bravo, corajoso como todo bom americano. E você, astutamente, está querendo fazer uma aliança acima dos partidos, um pouco como aqui no Brasil. Todo o seu discurso foi esse sinal de fazer uma ponte, buscar um “centrão” político, para encarar a direita furiosa do Tea Party, da Sarah Palin e da extrema-extrema dos republicanos. Mas, o seu desespero é forte, você está atacando os lobistas – no entanto, não é agora que você vai ganhar deles, eles sempre estiveram aí. E aí, você está apelando para o American Dream, você está apelando para um novo padrão de acumulação de capital que você ainda não sabe o que vai ser. Você, no seu primeiro State of Nation, estava muito melhor. Você sabia que o Longo Prazo tinha que ser profundamente visado. Agora você ainda continua com o LP, mas está entrando no escorregador do Curto Prazo.

Você está falando a linguagem neoliberal – contenção do gasto público, congelamento dos salários dos funcionários públicos, eficiência estatal, política econômica feita pelas empresas (investimento e emprego). No fundo, você está saindo por um certo revival neoliberal, um pouco menos forte, eu até aceito, mas você está propondo que se faça uma aliança objetiva entre o capital e trabalho, via um esforço do setor produtivo, sobretudo para dar emprego. Mas, Obama, o PIB cresceu – e o emprego ficou parado. E você insiste nessa tese! “The economy is growing again”. Cadê os empregos? As empresas saíram pela produtividade e as finanças estão aplicando alegremente nos outros lugares, aqui no Brasil, por exemplo. Mas, faltam, sim, faltam empregos. O Roubini nos fala aqui com gravidade sobre isso.

Você deu o drible da vaca – aquele do Romário – neste discurso. Chamou repetidas vezes o centro do American Dream. Cansei de contar quantas vezes. E, num certo sentido, é o que todo liberal gosta de ouvir além dos pobres e de qualquer pessoa inteligente: "greater enphasis on math and science”. Obama, mas me preocupa alguma coisa. E o resto da cultura onde está? Claro, o nosso Pierre Legendre sempre disse: após o domínio da linha judaico-romano-cristã, o mundo se encaminhou para a ciência-tecnologia-economia. E você, Obama, acertou. Math and science. Claro é bem isso para agradar neoliberais e dar esperanças a quem não tem. Educação. Fernando Haddad morreria de inveja. Nessa linha, você pode ganhar muitos votos!

Não me enrola, Obama! O teu objetivo pode ser também o desenvolvimento da América. E é, tenho certeza. Mas, o objetivo primeiro agora é ganhar as eleições. Claro, você está jogando a grande com a pequena política. E, certo, você está encaminhando a América para a inovação, para a educação, para a energia. Certo! Mas, agora parece tudo encaminhamento de curto prazo, um tanto como quem corre para o carro apressadamente. E você, claro, você não desenha mais o longo prazo como desenhava. E você é contundente neste profundo aspecto: “None of us can predict with certainty what next big industry will be or where the new jobs will come from.” É aqui seu ponto: jobs. E você, para isso, política e economicamente, está nas mãos das finanças e da empresa produtiva privada. Só que você é como se dizia antigamente, você é um wise guy. E o André Scherer já falou ontem: o Jintao é o seu amigo. A China já percebeu que ela só crescerá e só se manterá na regata, com velas a pleno, se os Estados Unidos forem bem. Não foi assim que você conseguiu que a China comprasse da Boeing 700 aviões e com isso trazer 21.000 empregos? E seu discurso mostra bem: a China ainda não é inimiga da América. Por enquanto, é eleitora.












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