quarta-feira, março 25, 2009

Quarta-feira, 25 de março de 2009

NAUFRÁGIO DO PLANO GEITHNER?
Por Enéas de Souza

Não quero trazer as aves do mau agouro para o cais da discussão. Lendo sobre o plano Geithner e lendo Builter, Krugman, etc., etc., todos nossos admirados colunistas (onde se incluí André Scherer, com a sua excelente síntese, na segunda feira), fico com uma idéia assustadora e intranqüila. No limite, no limite, este plano não vai funcionar. E poderá agravar em muito a situação do Estado, comprometendo a mobilidade do FED ou aumentando o endividamento do Tesouro. De qualquer forma, é preciso ver o seguinte: o problema americano no nível geral, não está contido no plano Geithner, ele requer outra coisa, terá que lidar com a solução da dupla superacumulação de capital, aquela da esfera financeira e aquela da esfera produtiva.

As finanças querem retornar ao mesmo

O que seria preciso fazer? O plano de Geithner teria que, fundamentalmente, retirar os ativos podres dos balanços e re-capitalizar os bancos, Num segundo momento, impedir que retornasse a securitização e que reaparecesse a criação infernal dos diversos produtos financeiros Sem esse impedimento não há hipótese de conexão com o setor produtivo, hoje em situação desesperada. Pois, quem iria emprestar, sem garantias especiais ou públicas, para esta combalida área? E há um terceiro ponto vital, controlar – e foi o que pediram Geithner e Bernanke ao Congresso – o “bank shadow system”, principalmente os famosos “Hedge funds”, coração da elasticidade do risco financeiro. Mas, é preciso dizer que este terceiro item não faz parte do Plano Geithner, mas está conjugado com ele, pois é um dos itens mais perturbadores do sistema.

Onde está o capital?

Na minha análise, cabe dizer, em primeiro lugar, independente das avaliações dos mecanismos do plano, cujos detalhes operacionais ainda não estão totalmente disponíveis, que o que importa é salientar que não há nenhuma hipótese de retirar todos os ativos podres, nem os maus ativos dos balanços dos bancos. Não há capital suficiente para tal. Na melhor das hipóteses, teríamos que continuar a pedir ao Congresso novos recursos para serem aplicados nesta aventura da erradicação. Todavia, continuo no ataque e ampliando os golpes: mesmo se tudo desse certo até aqui, há um dos mistérios mais complicados que não apareceu, oculto por um temor incrível, o caso do personagem CDS (Credit Default Swuaps). Todos os financistas acham uma bomba de explosão inimaginável, uma bomba sem previsão e sem provisão. Mas, o que me parece ainda tremendamente complicado: todo esse esquema não seria capaz de re-capitalizar os bancos de forma a poderem atuar completamente restaurados, inteiramente recauchutados.

O que está na alma do plano

Digo recauchutado, por uma única razão: o que está na alma deste plano é de novo a retomada do esquema da securitização, a retomada da possibilidade de um outro carrossel especulativo. Aqui chegamos ao ponto: a finanças tem um sentido definido no sistema capitalista, a sua natureza é a de uma flor especulativa. E como especulativa ela não vai querer nem que seja fortemente controlada, depois de ter chegado ao nível da auto-regulação, nem que seja posta a ferros para desamarrar o crédito para a produção. Isso só poderia acontecer se politicamente fizessem um vantajoso acordo ou fossem inteiramente derrotadas. O que, embora fragmentada e ferida, ela ainda não está fazendo, no circo da economia, o número do rastejar ou a prova da subordinação.

A prudência versus os indícios

Talvez fosse mais prudente da minha parte aguardar mais um tempo pra verificar e aprofundar os efeitos do plano Geithner. Mas, não vejo condições para que se altere o comportamento da esfera financeira, dada a situação atual. O que se pode esperar é que o plano possa, num primeiro momento, encontrar alguma temporária solução na órbita das finanças, mas os problemas dos títulos podres, todo mundo sabe, não serão eliminados. O rastro de pólvora dos CDS estará sempre à espreita para derrubar a frágil barreira de uma precária capitalização dos bancos. Longe, portanto, de uma solução para esfera em pauta. E não há, a meu ver, nenhuma hipótese, nesta fase dos acontecimentos, de que o crédito volte a fluir tranquilamente para o setor privado produtivo. Este é um dos indícios de que os problemas das instituições e dos ativos podres ainda estão muito críticos, já que como vimos Geithner e Bernake querem autorização para controlar um dos setores que está incontrolável, os hedge funds.

Ter consistência ou não ter?

Penso, a esta altura da música da ópera, que a administração Obama tem que ter um plano unitário e estratégico para a economia, envolvendo tanto o setor produtivo, como o setor financeiro. E se vermos o discurso de Obama, as atitudes de Geithner, de Lawrence Summers e de Bernanke, não enxergamos nenhuma visão e muito menos algum planejamento para uma solução de curto prazo do sistema financeiro americano. E os europeus ainda querem que haja um plano para a organização do sistema financeiro internacional. O G-20 vai ser só a reafirmação do comando americano sem que se saia para uma estratégia global. Talvez algumas medidas para enrolar mais a crise na crise e colocar no carro americano o combustível da pressa e da pressão. Como escrevi: se no nível do plano, muitos economistas saltam contra o mesmo, no nível teórico – e daí porque acho que esse é um plano decepcionante – não há consistência para os objetivos de eliminar os títulos tóxicos, de re-capitalizar os bancos e de retornar, para o primeiro plano da economia, o fundamental do desenvolvimento do capitalismo, o crédito. O fato é um só, as finanças como Narciso só acha bonito o que é dinheiro e ativo financeiro cujo rendimento esteja aberto ao infinito.






Nenhum comentário: