quinta-feira, junho 11, 2009

CRISE FINANCEIRA MUNDIAL
Coluna das quintas
11 de junho de 2009

BRASIL: NO MÁXIMO
UMA GRIPE FORTE

Por Enéas de Souza

Cai, cai balão

Duas quedas que caem bem na economia brasileira. O PIB caiu –1,8 % no primeiro trimestre de 2009 em relação ao mesmo período do ano passado e a taxa Selic foi alterada ontem e ficou em 9,25, perdendo 1%. Digo que são quedas que caem bem, porque a primeira foi uma diminuição menor do que a que o governo, o mercado e os analistas pensavam. E a segunda, foi a surpresa, quase escandalosa, do COPOM. É verdade, que já deveriam ter tomado esta medida. Só que um grupo tão conservador precisou ver, e a olho nu, que a economia brasileira estava perdendo altura, voando baixo, quase rasante. Por isso, o COPOM, como órgão do Estado, não poderia ficar como o navio de Fernando Pessoa, o da Ode Marítima, saindo e entrando no cais. O COPOM tem que atentar para o crescimento da economia. E parece que desta vez, olhou e olhou fundo e viu que é preciso criar forças que levem a reversão da queda da economia.

Salve lindo pendão da esperança

Um dos pontos mais interessantes desta crise financeira, que é uma crise de várias bolhas – bolha pontocom, bolha imobiliária, bolha das commodities – é, sem dúvida, o efeito mais tardio e menos profundo nos países emergentes do que o que ocorreu antes no centro da economia mundial. Os resultados recentemente divulgados sobre o Brasil mostram com clareza que de fato a crise chegou à terra de Machado de Assis, mas que depois de outubro de 2008 quando o mar encrespou feio como a cabeça de Medusa, este primeiro semestre de 2009 já revelou uma beliscada com um pouco de menos velocidade. Há alguns pequenos pontos a pôr em consideração, como quando a gente olha um panorama e algumas coisas desta paisagem ressaltam e nossa atenção, porque fazem relevo. E a gente nomeia e diz.

O primeiro ponto a extrair do nosso olhar é a já falada queda do PIB, que comparada com o final do trimestre do ano passado, deve ser comemorada. Caímos em relação a ele somente 0,8%. O que demonstra a desaceleração em ritmo de quase parando. Só que há um segundo ponto, um tanto desabusado, como se fosse um furúnculo grave. A queda brutal do investimento. Ou seja, a economia não vai se levantar tão rapidamente quanto gostaríamos. O BNDES fez projeções patrióticas, prevendo para 2009, um crescimento do investimento para 19%. Parece que eles estão olhando esta variável com uma lente de aumento poderosa, que nós - modestos observadores da economia - não estamos conseguindo ver.

Ora, a queda do investimento é um elemento decisivo da economia, porque as inversões produtivas possibilitam o crescimento da capacidade produtiva e repercutem como uma batida de samba na alegria do aumento do emprego. Com a caída referida e o acréscimo da capacidade ociosa, a manutenção da taxa de investimento – que, em 2008, foi de 19% – não parece estar assegurada. Evidentemente que um toque de baixa taxa de juros – caso da Selic – pode incrementar a esperança de uma melhoria da variável. Assim, com esta taxa básica de juros de 9,25%, estabelecendo uma taxa real de juros um pouco acima de 5%, vai reforçar, mesmo que levemente, as possibilidades de investimento. Porque é preciso considerar: as expectativas do empresariado de recuperação da economia ainda estão diminutas e a capacidade ociosa ainda está muito alta. Há que aumentar a ocupação das plantas e de forma consistente para que os empresários pensem em investir.

A pneumonia virou resfriado?

O recuo do PIB no primeiro trimestre foi certamente comemorativo, porque se dermos uma olhada no tombo americano, na escorregada das taxas européias, o Brasil, fica muito nítido com uma flor vermelha, saiu-se bem. E essa figura, nos conduz ao exame de um terceiro ponto: o comportamento do Governo. O que se pode constatar, então, é que ele tem respondido bem aos desafios, propondo atividades e soluções de natureza contra-cíclicas. Com essas intervenções, conseguiu colocar novamente o fortalecimento da presença do Estado na economia brasileira algo retirado pelo neoliberalismo. Mire o leitor no conjunto de medidas tomadas. Já lá atrás, o PAC, que foi meio apoiado, meio criticado pelos banqueiros, é hoje reclamado, por alguns empresários produtivos, como tímido. O maior empresário gaúcho chegou a dizer que seria necessário pelo menos o dobro de recursos para o Programa. Ou seja, o Governo estava certo na sua proposição. Agora, estamos em pleno lançamento do Plano de Habitação Popular, que está levando muita crítica, por parte de especialistas da realidade urbana, porém, que do ponto de vista econômico estrito senso, é uma postura forte e adequada. Quem sabe o Governo não consulta apenas os empresários, mas também a população, os urbanistas, os arquitetos, os ambientalistas, etc.? Isto quer dizer, vamos trazer a sociedade para o cenário das decisões.

Estas duas medidas acima têm sido acompanhadas por outras, como a diminuição ou isenção de tributos, que tem garantido uma demanda forte ao menos no setor automobilístico e no setor eletro-doméstico, linha branca. Ou seja, se nos dois primeiros pontos, expressos no parágrafo anterior, o PAC e o Plano de Habitação, os gastos do governo e/ou de órgãos do governo vestem a camiseta e entram em campo, nos outros, a liberação parcial ou global de impostos faz com que a economia não caia violentamente. Ou seja, um gesto político de oportunidade. E isso tudo deixando a dívida/PIB em 38,4% (dado de abril). Desta forma, o leitor poderá comparar o dado com os mais de 110% da relação japonesa, com os quase 80% da relação alemã, com os 70,4% da americana. E existe outro dado sintomático: com déficit fiscal confortável. Veja-se, inclusive, a previsão para o ano que vem é de 0,8% do nosso PIB contra um possível 13,6% dos Estados Unidos.

Falando ainda no Estado brasileiro, ressalta o continuado alto nível das reservas externas do Brasil – hoje em 205,5 bilhões de dólares – depois da hecatombe generalizada do efeito da crise global sobre todos os países. E tudo num ambiente não-inflacionário – pelo menos até agora. Estamos sim em crise, mas acho que estamos fazendo o melhor e o possível. Veja-se a diferença do Brasil de hoje para o de antes: antigamente se dizia que quando os Estados Unidos davam um espirro, a economia brasileira tinha uma pneumonia. Neste momento, é certo que teremos, no máximo, uma forte gripe; talvez fiquemos, no máximo, resfriados.

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