quinta-feira, junho 04, 2009

 CRISE FINANCEIRA MUNDIAL

4 de junho de 2009

 

Coluna das quintas

Por Enéas de Souza

 

A PAUSA QUE REFRESCA

 

Temos que dar boas notícias!

 

A crise já passou! Olha só a bolsa subindo, as finanças estão ficando contentes. No entanto, é preciso tomar cuidado com estas observações. Primeiro, a mídia hoje virou uma publicidade única, quase uma espécie de órgão de divulgação do capital financeiro. Segundo, mesmo na hipótese correta de que a esfera financeira tivesse se ajeitado, o que é uma insensatez, haveria que considerar que o problema fundamental não é a recuperação das finanças. Só isso não basta. O que é decisivo é sim, a recuperação da sociedade americana. Dêem uma olhada na produção industrial, no nível de capacidade ociosa, nas taxas de desemprego, nos níveis mensais de seguro-desemprego, e podemos ver que o desastre continua forte, nem ao menos diminuindo visível e substancialmente. Pode ser que cheguemos à conclusão que estamos num “pit stop” para um novo caminho desarvorado. Portanto, a economia americana é um Titanic que ainda não afundou totalmente.

 

Engodo - Parte II?

 

Voltemos ao sistema financeiro. O que é que mudou? A capitalização das finanças? Sim. Mas, em que nível? Foi suficiente? Não se sabe. Vamos, agora, como uma câmera que salta de fora para dentro dos bancos e das entidades que trabalham no setor, perguntar: aqueles “ativinhos podres” que estragaram a vida do neoliberalismo, já foram todos erradicados? Os balanços estão limpos? Duvido. Novas perguntas se seguem: estão todos voltando ao jogo, uns emprestando aos outros com taxas normais? Resposta: realmente os mercados estão fluindo razoavelmente. É verdade. Mas, salta logo a dúvida: não há nenhum medo de que o crédit crunch retorne com a mesma força? E continuam as questões: todas as instituições financeiras estão retomando e reorganizando os mercados americanos? Ou seja, mesmo sem nenhum desenho preparado, houve a recomposição de alguma arquitetura financeira?  Certo, a alavancagem voltou e o dinheiro começa a se avolumar. O FED lambusou o sistema de liquidez, com taxas de juros zero, mas pergunta-se: o fluxo financeiro voltou sem nenhum entrave? Não.

Então...

 

Pode-se pensar num neo-neoliberalismo?

 

Então, o que há? O que há é um enorme poder social das finanças, que pôde usar um forte e denodado apoio do Estado - empregando os títulos e a dívida estatal e a maquineta de fazer dinheiro - para conseguir dar ao setor uma capacidade de manobra, de manipulação dos números, de ativos, e de mercados – enfim, tempo – para tentar mudar o panorama da esfera financeira. E pode até mudar. Pode até enlaçar, via novos métodos de crédito, o setor produtivo; mas isso é ainda coisa impensável. Pode até fazer um neo-neoliberalismo, mas nunca mais fará o movimento original. Porque? Só se a sociedade for estúpida para cair no engodo de achar que pode ganhar dinheiro do jeito que ganhavam. Onde encontrar mercados? Onde estão os produtos, os ativos? No exterior, no Brasil, por exemplo. Mas, jogar no Brasil, jogar em outros mercados deste porte, não é recompor o neoliberalismo; é apenas seguir, de um certo modo, o mesmo caminho original, porém menos consistente, de buscar recuperar o capital perdido nos Estados Unidos. O Brasil sustentará as necessidades de acumulação financeira dos grandes capitais especulativos do mundo? Nem por megalomania dos ufanistas das finanças pode-se pensar nisto. Ou seja, há que ter cuidado em examinar os sinais de recuperação. E é importante assinalar: o fundamental nesse momento, não é apenas uma leve melhora no mercado financeiro; o importante é a economia como um todo. Olha só, caro leitor, como a esfera produtiva está embaralhada, com problemas espetaculares como as do setor automobilístico americano. Vamos, com calma, para dizer que a crise já passou! Pode haver um ventinho favorável, um ou outro indicador melhor, mas as forças que levantam uma economia têm que predominar sobre os elementos que a levam para baixo. E isso ainda não está no cone de possibilidades.

 

Adivinhe quem vai fazer o jantar?  A energia limpa?

 

Há também outro ponto a considerar. A economia produtiva atual está envolvida em problemas complexos. O mais fundamental é, sem dúvida, a questão energética. Tem havido esperanças fortes no campo do petróleo. Estão achando petróleo até em Cuba! Mas, a verdadeira questão é outra. Pois se o petróleo retornar a preços baixos, etc. etc., o tema se desloca para o meio ambiente, os estragos que este tipo de energia está fazendo. Que falem os ambientalistas!  Pergunta decisiva: é possível fazer uma energia limpa com o petróleo, a preços convenientes? Mas, ainda na questão produtiva, como é que podemos pensar em recuperação sem modificações tecnológicas profundas, devido à competição aguçada e à queda da eficiência marginal do capital em diversas áreas?

(Não está parecendo tudo um golpe publicitário para enganar os incautos habitantes do planeta?).

 

A pergunta inquietante

 

Tudo isso nos leva a um problema sério. Quais são as possibilidades dos cidadãos do mundo de mudarem, em seu benefício, um pouco esta enorme máquina de fazer dinheiro e de engano que se constituiu o neoliberalismo - e que apesar de falido, continua gerindo as nossas consciências e os nossos destinos?

 

 

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